Rússia aprova lei para viabilizar apreensão de bens do cidadão que criticar a guerra

Dinheiro, imóveis e outros objetos de valor podem ser tomados inclusive de quem se recusar a servir às Forças Armadas na guerra

O Legislativo da Rússia aprovou nesta quarta-feira (31), por unanimidade, um projeto de lei que viabiliza a apreensão de bens de cidadãos condenados por se posicionar contra a guerra da Ucrânia. A votação na Duma, câmara baixa do parlamento, teve 377 votos a favor e nenhum contrário. As informações são do jornal The Moscow Times.

“Uma maioria absoluta pensa que é necessário punir os traidores que, enquanto vivem no estrangeiro, atiram lama no nosso país, nos soldados e oficiais que participam da ‘operação militar especial’ e que apoiam e financiam o regime nazista em Kiev”, disse o presidente da Duma, Vyacheslav Volodin, após a votação.

Duma, a câmara baixa do parlamento russo: projeto de lei unânime (Foto: duma.gov.ru/Divulgação)

Com base na lei, o governo terá o direito de confiscar dinheiro, imóveis e outros objetos de valor de cidadãos que se posicionarem publicamente contra a guerra ou atuação dos militares de Moscou na Ucrânia. Eventuais títulos honorários concedidos anteriormente pelo Estado também podem ser tomados.

O alcance do texto legal é amplo. Também serão passíveis de punição os russos que se recusarem a servir às Forças Armadas ou que se associarem a “organizações indesejadas“, classificação atribuída a entidades que não se submetem ao controle estatal, como grupos de direitos humanos e veículos jornalísticos independentes.

Para que a lei entre em vigor, o projeto precisa ser agora aprovado pelo Conselho da Federação, sendo posteriormente assinado pelo presidente Vladimir Putin. Isso, entretanto, tende a ocorrer sem maiores problemas.

Por que isso importa?

Na Rússia, protestar contra o governo já não era uma tarefa fácil antes da eclosão da guerra na Ucrânia. Os protestos coletivos desapareceram das ruas a partir do momento em que a Justiça local passou a usar a pandemia de Covid-19 como pretexto para punir grandes manifestações, alegando que o acúmulo de pessoas feria as normas sanitárias. Assim, para driblar o veto, tornou-se comum ver manifestantes solitários erguendo cartazes com frases contra o governo.

Desde a invasão do país vizinho por tropas russas, no dia 24 de fevereiro de 2022, o desafio dos opositores de Putin aumentou consideravelmente, com novos mecanismos legais à disposição do Estado e o aumento da violência policial para silenciar os críticos. Uma lei do início de março de 2022, com foco na guerra, pune quem “desacredita o uso das Forças Armadas”.

Dentro dessa severa legislação, os detidos têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 22 mil). A pena mais rigorosa é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o Exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, eufemismo usado pelo governo para descrever a guerra. A reclusão pode chegar a 15 anos.

Desde o início da guerra, a ONG OVD-Info, que monitora a repressão na Rússia, reportou quase 20 mil detenções em protestos contra a guerra em todo o país.

A enorme maioria dos casos, cerca de 15 mil, foi registrada no primeiro mês de guerra. Depois, houve um pico entre setembro e outubro de 2022, devido à mobilização parcial de reservistas imposta pelo governo. Entre dezembro de 2022 e janeiro de 2023, foram registradas somente 22 detenções, um sinal de que a repressão estatal tem funcionado.

Tags: