Ucrânia afirma que a Rússia devolveu apenas 517 de quase 20 mil crianças abduzidas

Kiev diz que considera nessa estatística só os menores que cujas identidades conseguiu confirmar. Moscou fala em 700 mil vítimas

A Rússia devolveu a seus familiares apenas 517 de cerca de 20 mil crianças que teriam sido levadas pelas tropas de Moscou a partir de territórios da Ucrânia ocupados. A acusação foi feita por Dmytro Lubinets, comissário ucraniano para os Direitos Humanos, segundo repercutiu a rede Radio Free Europe (RFE).

Kiev alega ter confirmado as identidades de 19.546 crianças ucranianas que foram levadas para a Rússia ou para territórios que o país controla atualmente. Entretanto, ressalta que estes são apenas os menores cujas identidades foram confirmadas pelo governo ucraniano. Considerando também os casos não documentados, o número de abduções é drasticamente superior.

Para se ter ideia da dura realidade, Grigory Karasin, chefe da câmara alta do parlamento de Moscou, falou em julho de 2023 que 700 mil menores ucranianos haviam sido recebidos pela Rússia. Este número foi posteriormente confirmado por Maria Alekseyevna Lvova-Belova, comissária para os Direitos da Criança no gabinete do presidente russo Vladimir Putin.

Meninas ucranianas que fugiram de Kiev e receberam suporte do Unicef (Foto: Antonina Latayko/Unicef)

Inclusive, a extração de crianças ucranianas por tropas russas levou o Tribunal Penal Internacional (TPI) a emitir mandados de prisão, em março de 2023, contra Putin e Lvova-Belova.

De acordo com o TPI, os crimes que motivaram os mandados “teriam sido cometidos em território ucraniano ocupado pelo menos desde 24 de fevereiro de 2022”, data da invasão russa.

Lubinets falou sobre o caso durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, no domingo (14), e prometeu que seu governo lutará pelo retorno de todos os ucranianos abduzidos. Ele ainda reportou que 2.828 adultos também foram devolvidos pela Rússia, a maioria militares.

Crime de guerra e genocídio

A deportação em massa forçada de pessoas durante um conflito é classificada pelo Direito Internacional Humanitário como um crime de guerra. A transferência forçada de crianças, particularmente, configura um ato genocida. No caso da guerra da Ucrânia, tais denúncias surgiram ainda nos primeiros dias de combate e desde então vêm aumentando.

Em junho de 2022, menos de quatro meses após a invasão russa, a então alta comissária da ONU (Organização das Nações Unidas) para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, disse que seu escritório investigava tais alegações. Ela destacou a suspeita de que crianças ucranianas órfãs vinham sendo adotadas por famílias russas sem o devido procedimento legal e citou relatos de que a Rússia estava “modificando a legislação existente para facilitar o andamento das adoções” em Donetsk e Luhansk. 

Em fevereiro do ano passado, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, usou a palavra “genocídio” para definir a abdução de crianças ucranianas durante a guerra. Ele se manifestou em mensagem de vídeo exibida em sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

“O crime mais assustador é que a Rússia rouba crianças ucranianas”, disse Kuleba no evento realizado em Genebra, na Suíça, acrescentando que tais ações constituem “provavelmente a maior deportação forçada da história moderna”. E sentenciou: “Este é um crime genocida.”

A denúncia foi reforçada por Annalena Baerbock, ministra das Relações Exteriores da Alemanha. “O que poderia ser mais desprezível do que tirar as crianças de suas casas, longe de seus amigos, de seus entes queridos?”, questionou ela na mesma sessão do Conselho.

A chefe da diplomacia alemã citou o caso de 15 crianças que teriam sido levadas de Kherson ainda no início da guerra, sendo que a mais jovem tinha nove anos à época. “Não vamos descansar até que todas essas crianças estejam em casa”, afirmou a ministra. “Porque os direitos das crianças são direitos humanos, e os direitos humanos são universais.”

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