Ucrânia e aliados pedem à UE que proíba a entrada de cidadãos russos no bloco

Sugestão foi feita pelo presidente da Ucrânia e conta com o apoio das primeiras-ministras da Estônia e da Finlândia

A fim de aumentar a pressão sobre a Rússia pela guerra na Ucrânia, cidadãos russos deveriam ser proibidos de ingressar em países do bloco. A sugestão partiu do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky e foi abraçada por ao menos dois países-membros da União Europeia (UE). Vez que Moscou está “tirando as terras de outras pessoas”, seus cidadãos deveriam “viver em seu próprio mundo até que mudem a filosofia”, disse o político em entrevista ao jornal The Washington Post.

Desde a invasão da Ucrânia, em meio às inúmeras sanções ocidentais, as companhias aéreas russas foram proibidas de voar sobre a maior parte da Europa e da América do Norte, o que tornou mais difícil para os russos viajar ao exterior. Porém, não há uma proibição geral em vigor, como Zelensky sugere, e os russos ainda podem buscar rotas alternativas para ingressar na UE

A ideia de Zelensky foi apoiada por Kaja Kallas, primeira-ministra da Estônia. “Parem de emitir vistos de turista para russos. Visitar a Europa é um privilégio, não um direito humano. As viagens aéreas da Rússia estão fechadas. Isso significa que, enquanto os países Schengen emitem vistos, os vizinhos da Rússia carregam o fardo. Hora de acabar com o turismo da Rússia agora”, disse ela no Twitter.

Quem também deu aval à proposta foi Sanna Marin, premiê da Finlândia, país que recentemente deixou a neutralidade de décadas e solicitou o ingresso na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) por medo de uma agressão russa. “Não é certo que, enquanto a Rússia está travando uma guerra agressiva e brutal de agressão na Europa, os russos possam viver uma vida normal, viajar pela Europa, serem turistas”, disse ela, de acordo com o jornal britânico Guardian.

A própria Finlândia, que compartilha com a Rússia uma fronteira de cerca de 1,3 mil quilômetros, tem recebido um número crescente de russos em meio ao conflito. Por via rodoviária, eles atravessam a linha que divide as duas nações com o objetivo de comprar produtos agora indisponíveis em seu país e também para ir de lá a outros destinos europeus.

O governo finlandês tem agido contra esse fluxo e estuda a possibilidade de alterar a legislação nacional, permitindo o estabelecimento de barreiras ao longo de sua fronteira com a Rússia. Isso porque a linha divisória atualmente tem apenas algumas marcações, sem qualquer tipo de barreira efetiva.

Embora a via rodoviária siga aberta, Helsinque já adotou medidas para reduzir a entrada de russo. Por exemplo, aumentou o patrulhamento na fronteira e encerrou os serviços de trens entre os dois países. Também pretende limitar os vistos emitidos a cidadãos do país vizinho, mas enxerga uma barreira legal para impor a proibição total.

Kaja Kallas, primeira-ministra da Estônia, no Parlamento Europeu, em março de 2022 (Foto: Flickr)

Outros países que fazem fronteira com o território russo, como Letônia, Lituânia e Polônia, também endureceram as regras de emissão de vistos. No entanto, admitem que é necessária uma posição conjunta da UE para regular a questão. Isso porque o visto eventualmente emitido por um país inserido no Espaço Schengen não pode ser recusado por outro.

A questão deve ser debatida pela UE no final de agosto, em reunião entre os ministros da Relações Exteriores do bloco, na República Tcheca. “Nas futuras reuniões do conselho europeu, essa questão será ainda mais forte. Minha posição pessoal é a de que o turismo deve ser restringido”, afirmou Marin.

A ideia, porém, não é unânime. A tendência é que seja contestada por países que mantêm laços fortes com Moscou, como a Hungria. Mesmo nações que se opõem fortemente à Rússia, caso da Alemanha, podem vetar a medida, argumentando que separaria famílias, considerando a grande comunidade russa no exterior. A Comissão Europeia cita, ainda, casos de jornalistas e dissidentes, dizendo que todos os vistos a essas categorias de pessoas devem ser concedidos.

O Kremlin, por sua vez, condenou a ideia. “Qualquer tentativa de isolar a Rússia ou os russos é um processo que não tem perspectivas”, disse o porta-voz Dmitry Peskov na terça-feira (9), acrescentando que a proposta exibe uma “irracionalidade de pensamento” que está “fora dos gráficos”.

Por que isso importa?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho, no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo ano. Esses conflitos foram usados por Vladimir Putin como argumento para justificar a invasão integral, classificada por ele como uma “operação militar especial”.

“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país. Segundo Putin, a invasão serviria para libertar os cidadãos de etnia russa que vivem na Ucrânia sob opressão de Kiev.

No início da ofensiva, o objetivo das forças russas era dominar Kiev, alvo de constantes bombardeios. Entretanto, diante da inesperada resistência ucraniana, a Rússia foi forçada a mudar sua estratégia. As tropas, então, começaram a se afastar de Kiev e a se concentrar mais no leste ucraniano, a fim de tentar assumir definitivamente o controle de Donbass e de outros locais estratégicos naquela região. O sul ucraniano também entrou na mira, com diversas áreas agora ocupadas por Moscou.

Em meio ao conflito, o governo da Ucrânia e as nações ocidentais passaram a acusar a Rússia de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, dando início a investigações de crimes de guerra ou contra a humanidade cometidos pelos soldados do Kremlin.

O episódio que mais pesou para as acusações foi o massacre de Bucha, cidade ucraniana em cujas ruas foram encontrados dezenas de corpos após a retirada do exército russo. As imagens dos mortos foram divulgadas pela primeira vez no dia 2 de abril, por agências de notícias, e chocaram o mundo.

Fora do campo de batalha, a Rússia tem sido alvo de todo tipo de sanções. As esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais já começaram a sufocar a economia russa, e o país tem se tornado um pária global. Desde a invasão da Ucrânia, em 24 de fevereiro, quase mil empresas ocidentais deixaram de operar na Rússia, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral.

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