Ucrânia chama de ‘provocação’ a acusação russa de sabotagem em gasoduto

Moscou teria divulgado confissões de cidadãos ucranianos, que Kiev alega terem sido obtidas sob tortura em meio à violenta repressão na Crimeia

A Ucrânia, através de seu Ministério das Relações Exteriores, chamou de “provocação” as acusações da FSB (Agência de Segurança Federal da Rússia, da sigla em inglês) que sugerem o envolvimento de Kiev na sabotagem de um gasoduto na região de Simferopol, capital da Crimeia. As informações são da agência ucraniana de notícias Ukrinform.

Moscou teria divulgado confissões de cidadãos ucranianos que implicariam a Inteligência ucraniana e membros do Mejlis, o órgão representativo do povo tártaro na Crimea. Diplomatas de Kiev, porém, dizem que tais confissões foram obtidas ilegalmente, através de tortura, e contra-atacaram, acusando a Rússia de tentar esconder a violenta repressão contra os tártaros.

Protestos contrários à anexação da Crimeia em Londres, julho de 2014 (Foto: Divulgação/Jordan Busson)

“Consideramos essas acusações, em particular o envolvimento no ataque ao gasoduto, como mais uma provocação por parte da Federação Russa”, disse um comunicado emitido pela pasta. “Exigimos que a Federação Russa liberte imediatamente os cidadãos ucranianos detidos ilegalmente e pare de torturar e perseguir representantes do povo tártaro da Crimeia”, prossegue o texto.

Eldar Menseitov, ex-vice-presidente do Mejlis, é um dos acusados da sabotagem e foi preso no início de agosto. Outro detido por Moscou pela mesma acusação é o líder tártaro Nariman Dzhelal, atual vice do Mejlis. De acordo com a FSB, uma recompensa de US$ 2 mil (cerca de R$ 10,5 mil) foi oferecida para que os homens instalassem um explosivo no gasoduto.

Violência e irregularidades

Um relatório publicado no início de agosto pelo OHCHR (Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, da sigla em inglês) revela casos de tortura e desaparecimentos forçados atribuídos ao governo russo, bem como uma série de irregularidades jurídicas cometidas em casos julgados por tribunais da região anexada da Crimeia.

O relatório cita nominalmente a FSB como responsável por muitas das irregularidades em ações judiciais. A mais comum é a de testemunhas anônimas usadas pela acusação. Há casos de depoimentos incriminatórios colhidos por agentes e de amostras de DNA retiradas dos acusados antes que esses pudessem consultar os advogados. 

Eventos extremos indicam desaparecimentos forçados até hoje não solucionados. O documento cita 43 pessoas, sendo 39 homens e 4 mulheres, que sumiram na Crimeia desde março de 2014. Torturas também são habituais, e nenhum dos autores desses crimes foi condenado até hoje.

Por que isso importa?

A tensão entre Ucrânia e Rússia explodiu com a anexação da Crimeia por Moscou. Tudo começou no final de 2013, quando o então presidente da Ucrânia, o pró-Kremlin Viktor Yanukovych, se recusou a assinar um acordo que estreitaria as relações do país com a União Europeia (UE). A decisão levou a protestos em massa que culminaram com a fuga de Yanukovych para Moscou em fevereiro de 2014.

Após a fuga do presidente, grupos pró-Moscou aproveitaram o vazio no governo nacional para assumir o comando da península e declarar sua independência. Então, em março de 2014, as autoridades locais realizaram um referendo sobre a “reunificação” da Crimeia com a Rússia. A aprovação foi superior a 90%.

Após o referendo, considerado ilegal pela ONU (Organização das Nações Unidas), a Crimeia passou a se considerar território da Rússia. Entre outros, adotou o rublo russo como moeda e mudou o código dos telefones para o da Rússia.

O governo russo também apoia os separatistas ucranianos que enfrentam as forças de Kiev na região leste da Ucrânia desde abril de 2014. O conflito armado, que já matou mais de dez mil pessoas, opõe as forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, com suporte militar russo, ao governo ucraniano.

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