BRICS anuncia novos membros e se apresenta como opção à ordem global liderada pelos EUA

Bloco do Sul Global busca ampliar sua aliança para abranger Argentina, Etiópia, Irã, Arábia Saudita, Egito e Emirados Árabes Unidos, com o objetivo de contrabalançar a influência das alianças ocidentais em questões globais

Conforme o mundo entra em uma nova era de tensões e mudanças, os líderes de Brasil, Rússia, Índia, ChinaÁfrica do Sul se encontraram na semana passada para a cúpula anual do BRICS. Com um processo de expansão em andamento, não resta dúvida de que o grupo ganhou nova relevância no contexto de crescente competição entre as principais potências, de acordo com analistas ouvidos pelo jornal Independent.

Há cerca de 20 anos, o economista britânico Jim O’Neill criou o acrônimo BRIC para batizar o bloco, então sem os sul-africanos, destacando seu potencial como principais economias emergentes. Naquela época, trabalhando como banqueiro no Goldman Sachs, ele não previu que esses países formariam um bloco transnacional oito anos depois, em 2009.

Agora, durante a cúpula, o grupo de cinco nações em desenvolvimento decidiu expandir sua aliança para incluir Argentina, Etiópia, Irã, Arábia Saudita, Egito e Emirados Árabes Unidos, a fim de se estabelecer como um contraponto ao domínio das alianças ocidentais nos assuntos globais.

Representantes dos países do BRICS em Joanesburgo (Foto: Ricardo Stuckert/Palácio do Planalto – Flickr)

O presidente chinês Xi Jinping, um dos principais defensores dessa expansão, enfatizou que o aumento de membros é um marco “histórico”. Ele ressalta a determinação dos países do BRICS em promover a unidade e a cooperação com nações em desenvolvimento mais abrangentes.

Durante uma cúpula de líderes com duração de três dias em Joanesburgo, o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa anunciou que os seis novos candidatos serão oficialmente admitidos como membros a partir de 1º de Janeiro de 2024.

“O BRICS iniciou um novo capítulo em sua busca por um mundo justo, inclusivo e próspero”, afirmou Ramaphosa, que acrescentou: “Há acordo quanto à primeira etapa dessa expansão, com outras fases planejadas.”

Fortalecimento do Sul Global

A ampliação fortalece o peso econômico do BRICS e busca também aumentar a influência dos membros como defensores das nações do Sul Global, muitas das quais se sentem injustiçadas por instituições internacionais dominadas pelos EUA e outras nações ricas do ocidente, explicou o professor Swaran Singh, especialista em relações internacionais na Universidade Jawaharlal Nehru, na Índia.

Ele salientou que a expansão do BRICS não tem intenção de desafiar sistemas existentes, mas sim de criar uma plataforma alternativa que permita que países menos desenvolvidos e em desenvolvimento participem das decisões internacionais.

Isso reflete um desconforto com as estruturas de tomada de decisão que surgiram após a Segunda Guerra Mundial e reflete uma crescente demanda global por uma plataforma desse tipo, destacou Singh.

Mais de 40 países demonstraram interesse em se unir ao grupo BRICS, sendo que 22 formalmente buscaram adesão. Essa diversidade de candidatos, desde o Irã até a Argentina, reflete a motivação compartilhada de combater percepções de manipulação nas condições de competição global.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, também participou do anúncio de expansão, o que reflete a crescente influência do BRICS e sua demanda por reformas nas estruturas de governança global, incluindo Conselho de Segurança da ONU, Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial.

Embora os critérios para novos membros não sejam claros, os convidados refletem aspirações individuais dos membros de fortalecer suas alianças. O Brasil promoveu a entrada da Argentina, enquanto o Egito mantém vínculos comerciais fortes com Rússia e Índia. A entrada da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos, potências petrolíferas, destaca sua busca por influência global independente dos EUA.

Turbulência e transformação

Uma questão sensível dentro do BRICS é o fato de Rússia e Irã compartilharem a luta contra sanções de Washington e o isolamento diplomático. Com laços econômicos mais profundos após a invasão da Ucrânia, o presidente russo Vladimir Putin destacou em seu discurso a emergência de um mundo multipolar e criticou o Ocidente por ameaçar valores nas nações em desenvolvimento.

“Não se iluda: isso vai além do comércio”, adverte Daniel Silke, diretor da consultoria Political Futures, na África do Sul. Ele aponta para a fragmentação e polarização política global como fatores significativos, destacando que a China está mencionando ameaças de uma nova Guerra Fria com Washington como razão para a expansão.

Na quarta-feira (23), Xi afirmou: “O mundo está ingressando em um novo período de turbulência e transformação. Nós, os países do BRICS, devemos sempre lembrar nosso propósito fundamental de nos fortalecermos através da unidade.”

Apesar de abrigar cerca de 40% da população global e um quarto do PIB mundial, as divergências internas há muito prejudicam as ambições dos países do BRICS de se tornarem atores de destaque no cenário global.

Com economias de escalas amplamente diferentes e governos frequentemente com objetivos de política externa discrepantes, os países do BRICS não são vistos pelo Ocidente como uma ameaça séria aos blocos ocidentais. Mas é inegável que o bloco, hoje, é mais forte que quando foi criado. E essa evolução ainda não terminou.

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