Salões de beleza fecham as portas e tiram o emprego de mais de 60 mil afegãs

Sindicato dos Comerciantes do Afeganistão estima que 12 mil salões de beleza fecharam devido ao veto do Taleban

Terminou na terça-feira (25) o prazo para que os salões de beleza para mulheres deixassem de funcionar no Afeganistão, por ordem do Taleban. Nesta quarta (26), os estabelecimentos já amanheceram de portas fechadas, mais um gesto violento contra as afegãs, cada vez mais marginalizadas dentro da sociedade. A estimativa é de que a repressora norma custe o emprego de 60 mil mulheres.

Desde que os talibãs assumiram o poder, em agosto de 2021, as afegãs têm sido as principais vítimas da repressão. Elas não podem mais frequentar a escola a partir da sexta série do ensino médio, foram excluídas do ensino superior, perderam o direito de trabalhar em basicamente todos os setores da moribunda economia afegã, inclusive em organizações não governamentais (ONGs) e entidades humanitárias em geral, e em muitos casos não podem sequer ir à rua sem a companhia de um homem.

A proibição aos salões de beleza, no entanto, surge como um dos mais duros golpes contra as afegãs. Além de privá-las de mais uma fonte de renda, muitas vezes crucial para o sustento da família em meio à profunda crise que afeta o país, os estabelecimentos eram refúgios seguros para as mulheres, que ali podiam se reunir e socializar.

Integrantes do Taleban no Afeganistão (Foto: Wikimedia Commons)

A insatisfação generalizada levou muitas afegãs às ruas do país para protestar na semana passada. Em Cabul, o Taleban usou mangueiras de incêndio, armas de choque e disparos de advertência com munição letal para conter a manifestação.

“Por mais que protestemos, ninguém nos ouve. Todo mundo está sofrendo, e Deus sabe disso”, disse à rede Radio Free Europe (RFE) uma afegã identificada apenas como Roya, forçada a encerrar seu negócio devido ao veto. “Esvaziamos este armário e derramei lágrimas com cada item que removi”, acrescentou.

Outra afetada pela proibição, que pediu para não ser identificada por questões de segurança, cobrou do Taleban uma ação que ofereça às mulheres fontes de renda alternativas, vez que muita foram forçadas a deixar de trabalhar devido às leis segregacionistas impostas pelos radicais.

“O governo deveria nos dar trabalho. Vinte pessoas trabalham comigo para sustentar a família. O governo tem alguma coisa em mente para nós? O que devemos fazer em casa quando estamos desempregadas?”, questionou ela.

As explicações para o fechamento dos estabelecimentos são confusas. Sob o ponto de vista religioso, o Taleban argumentou que procedimentos como a modelagem de sobrancelhas, a aplicação de extensões no cabelo e a maquiagem interferem nas abluções (purificações rituais) necessárias antes das orações, segundo a agência Associated Press (AP).

Os radicais que governam o país deram até uma justificativa econômica para explicar o banimento dos salões de beleza. Alegam que os procedimentos realizados pelas mulheres antes do casamento, que são necessariamente pagos pela família do noivo, tornaram-se um fardo financeiro para os homens afegãos.

Entretanto, Akif Mohajer, porta-voz do Ministério para a Propagação da Virtude e Prevenção do Vício, disse que regras estabelecidas previamente não vinham sendo cumpridas. Entre elas, a necessidade de que as mulheres fizessem orações antes do trabalho e as abluções antes de se maquiarem. Também deveriam usar o hijab, véu islâmico que cobre o cabelo, mesmo dentro dos salões.

Algumas proprietárias de salões dizem que respeitavam as regras. Outras, no entanto, alegam que jamais foram notificada de tais obrigações.

Mulheres sem emprego

Dados fornecidos à RFE pelo Sindicato dos Comerciantes do Afeganistão indicam que 12 mil salões de beleza foram atingidos pela proibição. E cerca de 60 mil mulheres perderam seus empregos com o veto.

“Trata-se de mulheres perdendo um dos únicos lugares onde podiam buscar apoio e comunidade depois que o Taleban sistematicamente destruiu todo o sistema criado para responder à violência doméstica”, disse à AP Heather Barr, diretora associada de direitos das mulheres da ONG Human Rights Watch (HRW).

Em maço, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) já havia destacado que a crise econômica atinge as mulheres de forma desproporcional no Afeganistão. Segundo a entidade, o emprego feminino teve redução de 25% no quarto trimestre de 2022 em relação ao segundo trimestre de 2021, últimos meses antes de o Taleban assumir o poder. Já os níveis de emprego masculino caíram 7% no mesmo período.

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