Migrantes da Etiópia denunciam escravidão como empregadas domésticas no Líbano

Cidadãs etíopes deixam o país em busca de melhores condições e se deparam com rotinas de exploração

Um grupo de mulheres migrantes da Etiópia denunciou rotinas de escravidão no trabalho como empregadas domésticas no Líbano. Em entrevista à agência catari Al-Jazeera, elas relatam total ausência de remuneração e isolamento dos familiares etíopes.

Aster Goshu, 24, diz que recebeu apenas um salário desde que começou a trabalhar com uma família libanesa, em 2016. Na Etiópia, sua família chegou a considerá-la morta ao ser proibida de fazer contato por meses.

A mulher deixou o país africano em busca de trabalho ainda em 2014 – uma realidade comum entre jovens etíopes que buscam melhores condições econômicas. Agora, pede ajuda aos repórteres para que a ajudem a fugir da casa.

Migrantes da Etiópia denunciam escravidão como empregadas domésticas no Líbano
Cidadãos etíopes esperam para entrar na embaixada do Líbano na Etiópia em busca de visto para trabalho, Addis Abeba, julho de 2020 (Foto: Reprodução/Facebook/This is Lebanon)

Grupos de direitos humanos relatam casos como o de Aster há décadas. Ao chegar ao Oriente Médio, as mulheres africanas se deparam com a kafala – sistema de patrocínio que vincula o status legal do trabalhador migrante à relação contratual com o empregador.

Por este sistema, o trabalhador deve “receber um convite” antes de chegar ao país. A admissão é facilmente driblada já no aeroporto de Beirute, onde agências de emprego confiscam passaportes e cobram de migrantes, muitas vezes ilegais, valores de até US$ 500 para facilitar o recrutamento no Líbano.

A armadilha está pronta: unidos a traficantes, agenciadores encontram famílias para registrar esses trabalhadores sob a kafala. O resultado são migrantes excluídos das leis trabalhistas libanesas e envolvidos em uma larga rede de abusos.

Rotina de exploração

Há relatos de empregadores que forçam os trabalhadores a trabalhar por cargas horárias extremamente longas, sem dias de folga ou pagamento. Muitos retém os passaportes para impedir o retorno ao país de origem.

“Em casos extremos, já denunciamos trabalho forçado e tráfico de pessoas também”, disse Diala Haidar, ativista da Anistia Internacional no Líbano.

Desde 2017, a organização This is Lebanon, criada para reivindicar direitos dos trabalhadores domésticos sob a kafala, registrou mais de 6 mil denúncias de abusos. “Pague ou torne-se famoso”, diz o slogan do grupo, que pressiona empregadores abusivos com a ameaça de publicar detalhes das explorações.

“Resolvemos muitos casos via negociações, em particular quando se trata de casos relacionados a salários não pagos. Nós escalamos as coisas apenas quando os abusadores se recusam a cooperar”, disse a fundadora Dipendra Uprety.

A exploração já fez com que a Etiópia proibisse que seus cidadãos viajassem ao Líbano para trabalhar em 2008. A medida, porém, nunca foi devidamente aplicada e o número de trabalhadores no país do Oriente Médio só cresceu. Hoje, o Líbano registra cerca de 400 mil migrantes etíopes.

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