No Líbano, lideranças ‘de sempre’ articulam novo governo após explosão

Elite clientelista, que garantiu paz após guerra civil mesmo com potencial de conflito religioso, domina país

As mesmas lideranças libanesas consideradas responsáveis pela explosão que varreu a capital, Beirute, no último dia 4, se organizam para a montagem de um novo governo. A informação é do correspondente da Associated Press no Líbano, publicada nesta terça (26).

Com uma população acossada por uma pandemia global, uma crise econômica sem precedentes e a cidade parcialmente destruída, o sistema está mais forte do que nunca entre os libaneses.

No Líbano, lideranças 'de sempre' articulam novo governo após explosão
Protestos em Beirute, na capital do Líbano, em 2019 (Foto: Wikimedia Commons)

Desde o fim da guerra civil, em 1990, uma classe política clientelista sustentou o frágil equilíbrio libanês. Trata-se de um país pequeno, do tamanho do estado brasileiro de Sergipe, com divisões culturais e religiosas difíceis de conciliar.

Demografia e política

Há muçulmanos xiitas e sunitas, cristãos maronitas, coptas e ortodoxos e drusos e alauítas, entre outros. Tudo isso em uma população de cerca de quatro milhões.

Os maiores grupos, muçulmanos, cristãos e drusos, têm representação partidária e dividem o poder deixando pouco – senão nenhum – espaço para grupos independentes na política local.

“Basicamente, não temos como tirá-los dali”, afirmou Nizar Hassan, ativista da sociedade civil, à AP. Os mesmos nomes que comandam os partidos libaneses são as lideranças dos tempos da guerra, que começou em 1975 e durou 15 anos.

Partidos que ofereçam uma resposta política além do sectarismo étnico-religioso encontram pouco eco em uma população pouco habituada a um modelo que ignore essas diferenças na sociedade local.

As agências de segurança locais também se ocupam de sufocar eventuais movimentos oposicionistas, relatou Hassan. Emissoras de televisão e outros veículos de imprensa também relutam em receber pontos de vista distintos do modelo vigente, afirma.

Apoio do empresariado

No país, espera-se que os reflexos da crise econômica, do endividamento externo e da explosão em Beirute contribuam para que o setor empresarial libanês retire, de forma gradual, seu apoio ao atual modelo político.

Não é incomum que auxílios setoriais e ao empresariado venham condicionados a apoio, explica a reportagem.

Uma mudança na lei eleitoral foi desenhada para aumentar a representação de partidos não tradicionais. Mas não demorou até que políticos tradicionais capturassem a nova estrutura para garantir que não houvesse renovação no Parlamento.

O sistema seria, portanto, “imune a reformas”, na avaliação do ex-assessor do Ministério do Interior Khalil Gebara. “Ao mesmo tempo, o total colapso vai abrir uma caixa de Pandora com todo tipo de conflito sectário.”

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