A decisão do recém-empossado Congresso de El Salvador em destituir os cinco magistrados da Suprema Corte e o procurador-geral do país, na madrugada de domingo (2), já gerou um choque entre poderes. Logo depois da votação, o Judiciário classificou a medida como inconstitucional.
Na votação, 64 dos 84 deputados salvadorenhos acataram a troca, alinhada com o presidente Nayib Bukele. Os substitutos foram empossados imediatamente, registrou a Associated Press. A decisão ocorreu no mesmo dia da posse dos legisladores do partido Nuevas Ideias, de Bukele, eleitos em 28 de fevereiro.
“É um despendimento que não é precedido das garantias processuais necessárias”, disse a resolução da Câmara Constitucional, pouco depois da votação. Magistrados apontam que houve uma tentativa ilegal de impeachment – neste caso, uma forma de coação do Executivo. Bukele já desobedeceu a várias resoluções do órgão.
Não demorou para que a comunidade internacional se pronunciasse sobre o “autogolpe”. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, expressou “grande preocupação” em um telefonema a Bukele. Em comunicado, Washington destacou seu compromisso com o país desde que haja o fortalecimento às instituições democráticas.
A administração de Joe Biden já citou a corrupção em El Salvador, Guatemala e Honduras como uma das principais causas para o aumento do fluxo de migrantes na fronteira com o México. A violência e a pobreza forçaram um fluxo significativo de latinos que buscam visto para viver nos EUA.
A relação é diferente da concedida pelo ex-presidente Donald Trump em seus anos de mandato. O Pentágono forneceu recursos para o combate do narcotráfico enquanto os dois chefes de Estado estreitavam relações graças às suas afinidades ideológicas. “Com todo o respeito, estamos limpando nossa casa e isso não é responsabilidade sua”, escreveu o presidente no Twitter.
Bukele ainda expressou satisfação com a sessão de estreia da bancada de seu partido. “Eu sei que eles não podem fazer tudo em um dia. Sei que a maioria dos salvadorenhos está ansiosa para um segundo encontro”.
Destituição
A OEA (Organização dos Estados Americanos) também condenou Bukele, que ancorou o discurso dos legisladores salvadorenhos contra a Suprema Corte por “falta de transparência”. Os cinco juízes destituídos eram protagonistas no tribunal de 15 membros e estavam entre os poucos controles restantes à expansão do poder do presidente.
Bukele e seus aliados acusam os magistrados de impedir a estratégia de saúde do governo em meio à pandemia da Covid-19. O legislativo ainda deve pedir pela demissão do Procurador dos Direitos Humanos, Apolônio Tobar.
A constituição de El Salvador define que a destituição desses funcionários só pode ocorrer por “motivos legais” com o voto de dois terços dos deputados eleitos. O partido de Bukele, Nuevas Ideias, foi o mais votado nas eleições de 28 de fevereiro. A sigla governa 152 dos 262 municípios do país e tem 56 cadeiras no Congresso.