China projeta “conflito geopolítico” devido à presença militar dos EUA nas Filipinas

Beijing questiona a afirmação de que o aumento da presença militar norte-americana no país insular tem objetivo humanitário

A Embaixada da China nas Filipinas disse, em comunicado divulgado no domingo (12), que conceder a Washington o acesso a outras quatro bases militares, além das cinco já ocupadas no país do Sudeste Asiático, resultará em um “conflito geopolítico”. Os Estados Unidos desembarcaram com força na nação insular, apertando ainda mais seu cerco no Pacífico contra a crescente influência de Beijing na região. As informações são da rede Radio Free Asia.

O comentário veio um dia após uma entrevista à TV filipina dada pela embaixadora norte-americana em Manila, MaryKay Carlson, na qual ela declarou que a ampliação das instalações militares no país visava a impulsionar a economia local e permitir que as forças dos EUA respondam com agilidade às necessidades humanitárias locais.

“Considerando que os EUA afirmam que tal cooperação visa a ajudar os esforços de socorro das Filipinas e alguns americanos até mesmo elogiam os locais da EDCA (Acordo de Cooperação de Defesa Aprimorada, da sigla em inglês), como impulsionadores da economia local, é claro e simples que esses movimentos fazem parte dos esforços dos EUA para cercar e conter a China por meio de sua aliança militar com este país”, disse o comunicado assinado por um porta-voz da missão diplomática chinesa.

Secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, cumprimenta o secretário de Relações Exteriores das Filipinas, Enrique Manalo (Foto: United States Government/Reprodução Twitter)

Com relação às patrulhas conjuntas EUA-Filipinas propostas no Mar da China Meridional, Carlson disse que tais atividades seriam um componente importante para garantir que as hidrovias sejam livres e abertas, referência à demanda da China pelo controle quase total da navegação na região.

Diante da afirmação, a embaixada chinesa disse que Washington pretende “garantir sua hegemonia e interesses geopolíticos egoístas, atualizando continuamente sua presença militar nas Filipinas, obtendo acesso a mais bases para destacamentos militares”, disse o comunicado, que acrescentou: “Agrupar as Filipinas nas carruagens do conflito geopolítico prejudicará seriamente os interesses nacionais filipinos e colocará em risco a paz e a estabilidade regionais”.

Em 2014, as Filipinas e os Estados Unidos assinaram o EDCA, que complementou o Acordo de Forças Visitantes (VFA, da sigla em inglês) de 1999. O VFA fornece cobertura legal para exercícios militares conjuntos em larga escala entre os dois aliados de longa data.

Em novembro, Kamala Harris, vice-presidente dos EUA, afirmou que seu país prestaria apoio militar às Filipinas em caso de um ataque da China, com quem Manila trava uma disputa histórica pelo controle das concorridas águas do Mar da China Meridional. 

Carlson não respondeu sobre a localização das novas bases militares, porém, adiantou que elas podem ser anunciadas “nos próximos meses” e que os locais foram escolhidos para “ajudar a proteger os meios de subsistência dos pescadores filipinos, bem como para ajudar em crises humanitárias”.

“Nosso objetivo mútuo é dissuadir o conflito, não instigá-lo”, disse a embaixadora sobre o contínuo assédio chinês no Mar da China Meridional.

Embora nenhum local tenha sido mencionado, citando estudos conduzidos por vários think tanks e estudiosos, bem como ONGs locais, a embaixada chinesa em Manila questionou no comunicado a escolha das províncias de Isabela e Cagayan para abrigarem duas das bases adicionais. O documento observou que elas estão localizadas perto de Taiwan, levantando a dúvida sobre se os EUA realmente pretendem ajudar as Filipinas no alívio de desastres por lá ou se há um interesse estratégico nisso.

“É realmente do interesse nacional das Filipinas serem arrastadas pelos EUA para interferir na questão de Taiwan?”, questionou o comunicado chinês.

Segundo fontes familiarizadas com o assunto, pelo menos uma base estaria localizada na ilha de Luzon, ao norte. A região é tida como uma posição estratégica para operações militares de defesa de Taiwan em caso de um possível ataque de Beijing. Com isso, as Filipinas se consolidam como um parceiro estratégico fundamental para os EUA. 

Para Beijing, Washington tem como objetivo primordial na região criar uma barreira entre chineses e filipinos.

“Precisamos nos concentrar na cooperação e no desenvolvimento e realmente salvaguardar, promover e construir a paz, a estabilidade, a prosperidade de nossa região e trazer benefícios mais tangíveis para as pessoas de nossos dois países”, acrescentou o comunicado.

Por que isso importa?

Filipinas e China reivindicam grandes extensões do Mar da China Meridional, que é uma das regiões mais disputadas do mundo. Vietnã, Malásia, Brunei e Taiwan também estão inseridos na disputa pelos ricos recursos naturais da hidrovia.

A China é acusada de avançar sobre a jurisdição territorial dos demais países construindo ilhas artificiais e plataformas de vigilância, além de incentivar a saída de navios pesqueiros para além de seu território marítimo. O objetivo dessa política é aumentar de forma gradativa a soberania chinesa no Mar da China Meridional.

No caso específico da relação entre Beijing e Manila, um momento particularmente tenso ocorreu em março de 2022, quando um navio da guarda costeira chinesa realizou “manobras de curta distância” que quase resultaram em colisão com um navio filipino.

Na ocasião, Manila alegou que o navio chinês desrespeitou a conduta náutica quando navegava próximo à ilha Scarborough Shoal, que fica na Zona Econômica Exclusiva (ZEE) filipina, 124 milhas náuticas a noroeste do continente, e é alvo de disputa internacional.

Em resposta, o então porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China Wang Wenbin disse à época que o país dele tem direitos soberanos sobre Scarborough Shoal. Entretanto, uma arbitragem internacional em Haia, em 2016, invalidou as reivindicações de Beijing sobre a hidrovia, pela qual passam anualmente cerca de US$ 3 trilhões em comércio marítimo.

Tags: