Nova York acolhe exposição que relembra o Massacre da Praça da Paz Celestial

Ativistas que sobreviveram ao violento episódio de 1989 e buscaram refúgio nos EUA mantêm viva a lembrança das atrocidades

Às vésperas do aniversário do Massacre da Praça da Paz Celestial, evento trágico ocorrido em 4 de junho 1989 na China, no qual o Partido Comunista Chinês (PCC) reprimiu violentamente manifestantes pró-democracia, as vigílias em memória das vítimas seguem proibidas em Hong Kong desde os bloqueios sanitários decorrentes da Covid-19, à medida que a cidade enfrenta restrições crescentes à liberdade de expressão. Diante desse cenário, Nova York aceitou receber uma exposição que lembra o acontecimento histórico, segundo informa a agência Associated Press.

Diante das tentativas do governo chinês de silenciar a dissidência e colocar uma lápide na memória do massacre, os chineses que vivem no exterior unem esforços para garantir que as atrocidades cometidas há mais de três décadas não sejam esquecidas. Em Nova York, uma comunidade com raízes chinesas tem se unido para organizar eventos e exposições que destacam a importância de lembrar as vítimas e reafirmam o compromisso com a liberdade, a democracia e os direitos humanos.

A área da praça após o massacre, em junho de 1989 (Foto: Wikimedia Commons)

Entre eles está Fangsuo Zhou, residente em Nova Jersey desde que fugiu da repressão em sua terra natal. Ele recorda vividamente o trágico dia de 1989, quando as tropas comunistas invadiram a Praça da Paz Celestial em Beijing.

Zhou, hoje na casa dos 50 anos, tem coletado evidências da brutalidade chinesa desde então. Ele é responsável pela “Exibição Memorial de 4 de junho” em Nova York, que apresenta itens como toalhas ensanguentadas, faixas usadas como torniquetes, recortes de jornais, cartas e uma tenda utilizada pelos manifestantes estudantis na Praça da Paz Celestial no final dos anos 1980.

A exposição está localizada no quarto andar de um prédio comercial e preenche o papel de um evento similar de Hong Kong, encerrado por Beijing há dois anos.

“Estamos mantendo a evidência imutável do que o PCC fez”, disse ele. “Este é o legado mais importante para a China”, disse Zhou sobre a mostra aberta ao público nesta sexta-feira (2).

Repressão chinesa

Conforme cresce a repressão à dissidência, Hong Kong amplia também a censura às lembranças do massacre. Em 2022, as autoridades removeram monumentos que foram erguidos em memória dos protestos, incluindo uma escultura chamada “Pilar da Vergonha” que retrata corpos empilhados como um símbolo dos mortos durante os últimos dias do levante.

Feita pelo escultor dinamarquês Jens Galschiot, a obra foi retirada em dezembro do campus da Universidade de Hong Kong e agora está em poder das autoridades.

“Eles querem fazer todo mundo esquecer que são um regime construído sobre violência e mentiras”, disse Dan Wang, um dos líderes estudantis que estava ao lado de Zhou durante o incidente, sendo classificados pelo regime chinês como “contrarrevolucionários”.

Wang ainda afirmou que é sua obrigação e responsabilidade criar essa exposição memorial com o intuito de preservar a verdade histórica e combater os esforços do PCC de apagar a memória coletiva.

Os organizadores optaram por localizar a coleção de memorabilia no centro de Manhattan, em vez de Chinatown, com o objetivo de tornar a história mais acessível ao público em geral.

Pedra no assunto

Até antes da pandemia, Hong Kong e Macau eram os únicos lugares na China onde era legalmente possível realizar atos para relembrar o massacre. Nessas regiões, a política de “um país, dois sistemas” foi usada para balizar a devolução à China desses territórios, ex-colônias do Reino Unido e de Portugal.

Em Hong Kong, no entanto, o grupo da sociedade civil que organizou a vigília foi dissolvido, e alguns de seus líderes hoje enfrentam acusações criminais desde que Beijing pôs em vigor a lei de segurança nacional, em junho de 2020. Entre eles, ativistas proeminentes como Jimmy Sham e Figo Chan. Temendo a perseguição, mais de 30 grupos da sociedade civil foram desfeitos.

Após atrair dezenas de milhares de participantes, as vigílias anuais foram interrompidas em 2019, no 30º aniversário da revolta estudantil em Beijing, devido ao avanço do coronavírus. Depois disso, o governo não autorizou a retomada desses eventos.

O massacre

Em 4 de junho de 1989, centenas de milhares de estudantes e trabalhadores haviam se reunido para lamentar a morte do secretário-geral do PCC, Hu Yaobang. Porém, a marcha pacífica logo se transformou em um movimento por maior transparência, reformas e democracia na China.

O exército foi mobilizado para dispersar a multidão e usou com armas de fogo e tanques de guerra, considerando a manifestação popular uma ameaça ao poder do PCC. Números oficiais de mortos e feridos nunca foram divulgados, vez que o governo chinês tornou o assunto proibido no país. Porém, dados levantados pelo governo britânico e reproduzidos pela BBC apontam dez mil vítimas fatais. 

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