Membro de ‘esquadrão da morte’ de ditador belarusso será julgado na Suíça

Ex-membro de uma unidade militar especial confessou participação no sequestro e na morte de opositores do ditador

A Justiça da Suíça começará a julgar no próximo mês um ex-agente dos serviços de segurança de Belarus, que serviu ao presidente Alexander Lukashenko no início de seu governo, nos anos 1990. Ele é acusado de envolvimento em casos de desaparecimento forçado de dissidentes, segundo informações da agência Associated Press (AP).

Na visão de ativistas de direitos humanos que acompanham, o julgamento de Yuri Harauski, ex-membro de uma unidade militar conhecida como SOBR, é um “divisor de aguas”, pois pode vir a colocar outros seguidores do regime na mira das autoridades internacionais.

“Este pode ser um momento decisivo para a Justiça internacional relativamente aos crimes do regime belarusso”, disse Ilya Nuzov, da ONG FIDH (Federação Internacional dos Direitos Humano). Segundo ele, uma condenação “poderia estabelecer fatos que poderiam mais tarde ser usados ​​para perseguir aqueles que ordenaram a prática do crime, incluindo o próprio Lukashenko.”

Presidente de Belarus, Alexander Lukashenko (Foto: Departamento de Estado dos EUA/Reprodução)

O caso em tela será iniciado por um tribunal da cidade suíça de St. Gallen em 19 de setembro e abordará os desaparecimentos de três pessoas em 1999.

As vítimas são Yuri Zakharenko, ex-ministro do Interior demitido por Lukashenko em 1996, Viktor Gonchar, líder da oposição política belarussa na ocasião, e Anatoly Krasovsky, um jornalista. Os promotores planejam pedir uma pena de três anos de prisão, com dois deles suspensos.

“O caso é inovador: pela primeira vez, um cidadão bielorrusso é julgado por desaparecimento forçado com base na jurisdição universal”, afirmou Nuzov, citando o princípio jurídico que permite a tribunais estrangeiros processar casos como genocídio, tortura e crimes contra a humanidade, mesmo se cometidos no exterior.

Já o réu é cidadão belarusso e desde 2018 vive exilado na Suíça. Detido, ele teria confessado envolvimento no sequestro e na morte das vítimas.

“Pela primeira vez, um membro do esquadrão da morte de Lukashenko é julgado por envolvimento nos desaparecimentos forçados de opositores políticos”, disse Sviatlana Tsikhanouskaia, líder da oposição belarussa. “Este caso inovador transmite uma mensagem poderosa ao regime de Belarus: ninguém escapará da justiça.”

Por que isso importa?

Belarus testemunha uma crise de direitos humanos sem precedentes, com fortes indícios de desaparecimentos, tortura e maus-tratos como forma de intimidação e assédio contra seus cidadãos. Dezenas de milhares de opositores ao regime de Lukashenko, no poder desde 1994, foram presos ou forçados ao exílio desde as controversas eleições no ano passado.

O presidente, chamado de “último ditador da Europa”, parece não se incomodar com a imagem autoritária, mesmo em meio a protestos populares e desconfiança crescente após a reeleição de 2020, marcada por fortes indícios de fraude. A porta-voz do presidente Natalya Eismont chegou a afirmar em 2019, na televisão estatal, que a “ditadura é a marca” do governo de Belarus.

Desde que os protestos populares tomaram as ruas do país após o controverso pleito, as autoridades belarussas têm sufocado ONGs e a mídia independente, parte de uma repressão brutal contra cidadãos que contestam os resultados oficiais da votação. A organização de direitos humanos Viasna diz que há atualmente quase de 1,5 mil prisioneiros políticos no país.

O desgaste com o atual governo, que já se prolonga há anos, acentuou-se em 2020 devido à forma como ele lidou com a pandemia, que chegou a chamar de “psicose”. Em determinado momento, o presidente recomendou “vodka e sauna” para tratar a doença.

A violenta repressão imposta por Lukashenko levou muitos oposicionistas a deixarem o país. Aqueles que não fugiram são perseguidos pelas autoridades e invariavelmente presos. É o caso de Sergei Tikhanovsky, que cumpre uma pena de quase 20 anos de prisão sob acusações consideradas politicamente motivadas. Ele é marido de Sviatlana Tsikhanouskaia, candidata derrotada na eleição presidencial e hoje exilada.

Já o distanciamento entre o país e o Ocidente aumentou com a guerra na Ucrânia, vez que Belarus é aliada da Rússia e permitiu que tropas de Moscou usassem o território belarusso para realizar a invasão.

Tags: