Polícia alemã desmantela rede que fornecia suporte financeiro ao Estado Islâmico

Suspeitos faziam parte de uma rede internacional que apoia as atividades extremistas do grupo extremista na Síria

A polícia alemã conduziu uma grande operação nesta quarta-feira (31), mobilizando mais de mil agentes para realizar batidas em uma rede financeira ligada ao Estado Islâmico (EI). Sete pessoas foram presas em meio a buscas coordenadas em mais de cem instalações, segundo informações divulgadas por promotores federais à rede Deutsche Welle (DW).

A equipe multinacional desmantelada consistia de quatro alemães, além de um alemão-marroquino, um kosovar e um cidadão turco. Segundo o procurador federal da Alemanha, esse grupo fazia parte de uma rede internacional que apoia as atividades terroristas do EI na Síria por meio de doações financeiras.

No total, o grupo arrecadou US$ 69.367 (mais de R$ 350 mil) através de intermediários financeiros que abriram contas, bem como por um membro da equipe que solicitou doações. Esses fundos foram posteriormente transferidos para membros do EI na Síria ou para outros intermediários.

Integrantes dos exércitos dos EUA e do Iraque exibem bandeira do Estado Islâmico (Foto: Flickr)

Os promotores afirmaram que os sete suspeitos desempenharam um papel central como intermediários e que os fundos arrecadados foram utilizados para apoiar membros do EI detidos em campos no norte da Síria, além de supostamente financiar sua fuga.

As buscas foram realizadas em diversas localidades, incluindo Berlim, Baviera, Hamburgo, Hesse, Turíngia e Baixa Saxônia. Também houve uma invasão em uma propriedade na Holanda.

A maioria dos suspeitos presos de nacionalidade alemã deve comparecer perante um tribunal federal nesta quarta e quinta-feiras (1º), a fim de determinar se deverão ser mantidos em prisão preventiva.

O montante arrecadado foi resultado de campanhas em mídias sociais, as quais estavam em andamento há vários anos.

A ministra do Interior alemã, Nancy Faeser, ressaltou a seriedade com que as agências policiais encaram a ameaça representada pelo EI e enfatizou que a ameaça do terrorismo islâmico permanece alta, com as autoridades vigilantes. Ela reiterou o compromisso contínuo de reprimir atividades relacionadas a grupos islâmicos radicais, destacando a determinação em garantir a segurança e a proteção da população.

“A identificação e esclarecimento de redes de financiamento no campo do terrorismo islâmico é de grande importância. São justamente os recursos financeiros que possibilitam a disseminação de ideologias anticonstitucionais e estão na base da ação dos terroristas”, disse Nancy, que acrescentou: “É, portanto, crucial desvendar e desmantelar essas redes”.

Por que isso importa?

Embora as ações antiterrorismo globais tenham enfraquecido os dois principais grupos jihadistas do mundo, Estado Islâmico (EI) e Al-Qaeda, ambos conseguem se manter relevantes e atuantes. A estratégia dessas duas organizações inclui o recrutamento de novos seguidores através da internet e a forte presença em zonas de conflito como a África, onde são representadas por grupos afiliados regionais. O Afeganistão, agora sob o comando do Taleban, também é um porto seguro para muitos jihadistas.

O continente africano ganhou importância em meio às derrotas impostas às grandes organizações jihadistas em outras regiões, caso do Oriente Médio. Em 2017, o exército iraquiano anunciou a derrota do EI no Iraque, com a retomada de todos os territórios que o grupo dominava desde 2014. O EI, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém por lá apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas do grupo na Síria.

Em fevereiro do ano passado, o EI sofreu um duro golpe quando o exército norte-americano anunciou ter matado Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurashi, líder da facção. Em outubro, o próprio grupo revelou que Abu al-Hassan al-Hashimi al-Qurashi, sucessor de Abu Ibrahim, também foi morto. Um terceiro líder do grupo, Abu al-Hussein al-Husseini al-Qurashi, foi morto em abril de 2023 durante ação de forças turcas.

No caso da Al-Qaeda, que igualmente mantém facções relevantes na África, a sobrevivência do grupo pode ser explicada também pela tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. “As avaliações dos Estados-Membros até agora sugerem que a Al-Qaeda tem um porto seguro sob o Taleban e maior liberdade de ação”, diz relatório da ONU divulgado no final de maio do ano passado.

“A Al-Qaeda permanece no sul e leste do Afeganistão, onde tem uma presença histórica”, diz o relatório. “O grupo supostamente tem de 180 a 400 combatentes, com as estimativas dos Estados-Membros inclinando-se para o número mais baixo”, prossegue o documento, que cita cidadãos de BangladeshÍndiaMianmar e Paquistão como sendo integrantes da facção.

O ex-líder da organização Ayman al-Zawahri, inclusive, foi morto em território afegão em um ataque das forças armadas dos EUA no dia 1º de agosto de 2022.

Anteriormente, a ONU já havia lembrado que a Al-Qaeda chegou a parabenizar publicamente os talibãs pela ascensão ao poder. E alegou que um filho de Bin Laden, Abdallah, visitou o Afeganistão em outubro de 2021 para reuniões com o Taleban.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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