Rússia emite mandado de prisão contra a viúva de Alexei Navalny

Yulia Navalnaya deixou o país justamente para evitar uma detenção e tem dado sequência à luta do marido contra Putin

A Justiça da Rússia emitiu na terça-feira (9) um mandado de prisão contra Yulia Navalnaya, viúva de Alexei Navalny, maior rival político do presidente russo Vladimir Putin. Ela vive atualmente no exterior e se comprometeu a dar sequência à luta do marido contra o regime.

De acordo com a rede CNN, Navalnaya é acusada de “participar de uma organização extremista” e teve o nome adicionado a uma lista de criminosos internacionais procurados. A agência estatal russa de notícias RIA Novosti diz que o Código Penal do país prevê, para casos como o dela, uma pena de dois a seis anos de prisão.

Navalnaya se manifestou através da rede social X, antigo Twitter, e afirmou que já esperava pela ordem judicial. “Ah, qual não seria o procedimento usual? Listada como agente estrangeiro, depois a abertura de um processo criminal, depois uma prisão”, afirmou a ativista.

Na mesma postagem, ela reforçou as denúncias contra o presidente russo pela morte do marido e disse que ele deveria ser julgado pelo crime dentro do território russo, não pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), que igualmente emitiu um mandado de prisão contra Putin.

“Ao escrever sobre isso, por favor, não se esqueça de escrever o principal: Vladimir Putin é um assassino e um criminoso de guerra. Seu lugar é na prisão, não em algum lugar de Haia, em uma cela aconchegante com TV. Mas na Rússia, na mesma colônia e na mesma cela de dois por três metros em que ele matou Alexei”, disse ela.

Yulia resistiu por muito tempo à ideia de entrar para a política, mas mudou de postura desde a morte de Navalny. Poucos dias após o anúncio de que o marido havia morrido subitamente em um presídio na Sibéria, ela apareceu em um vídeo dizendo que “não tinha outra alternativa” a não ser dar sequência ao legado dele.

Alexei Navalny e Yulia Navalnaya: luta contra o regime de Putin (Foto: reprodução/Instagram)

Continuarei o trabalho de Alexei Navalny e lutarei pelo nosso país”, disse ela na oportunidade, em vídeo publicado no canal do YouTube mantido por aliados do ativista. “Peço que se unam a mim, compartilhando não apenas a dor e a angústia que nos envolvem, mas também minha raiva, indignação e ódio por aqueles que ousaram tirar nosso futuro.”

Navalnaya sempre acusou diretamente Putin pela morte. Mantém a acusação mesmo após reportagem do jornal The Wall Street Journal desvincular o presidente russo do caso. A afirmação se baseou em informações coletadas junto à inteligência dos EUA, para a qual é improvável que a morte tenha sido encomendada diretamente pelo líder.

Entre as entidades que concordam com a avaliação, o jornal destaca a CIA (Agência Central de Inteligência, da sigla em inglês), o Gabinete do Diretor de Inteligência Nacional e a unidade de inteligência do Departamento de Estado.

Para chegar a tal conclusão, a inteligência norte-americana considerou uma série de fatores, entre eles informações secretas e outras de domínio público. Avaliou, por exemplo, que o momento da morte de Navalny prejudicou Putin, que teve sua reeleição como presidente ofuscada.

Outro ponto controverso foi revelado dias depois da morte pela jornalista Maria Pevchikh, uma aliada de Navalny. Segundo ela, autoridades russas estavam perto de realizar uma troca envolvendo o falecido líder da oposição e dois cidadãos norte-americanos.  As negociações para a troca de prisioneiros estavam em estágios finais na noite de 15 de fevereiro, véspera da morte.

Quem foi Alexei Navalny

Mais proeminente opositor de Putin, Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A rede dele chegou a ter 50 sedes regionais e denunciava casos de corrupção envolvendo o governo, o que levou o Kremlin a agir judicialmente para proibir a atuação do opositor, que então passou a ser perseguido.

Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Ele voltou a Moscou em 17 de janeiro de 2021 e foi detido no aeroporto. Um mês depois, foi julgado e condenado por violar uma sentença suspensa de 2014, um caso de fraude. Os promotores alegaram que ele não se apresentou à polícia justamente quando estava em coma pela dose tóxica.

Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, chegou a fazer uma greve de fome para protestar contra a falta de atendimento médico. Depois, em junho de 2021, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais e a Fundação Anticorrupção (FBK) dele de funcionarem, classificando-os como “extremistas”. Julgado e condenado, o oposicionista jamais recuperou a liberdade e mantinha contato com seus seguidores pelas redes sociais, atualizadas por aliados.

A última medida retaliatória do governo contra Navalny foi transferi-lo para a gelada colônia penal IK-3, no Ártico russo, onde ele morreu no dia 16 de fevereiro de 2024. O inimigo número um de Putin desmaiou quando caminhava no pátio, e as tentativas de ressuscitá-lo, segundo os agentes carcerários, foram em vão.

Navalny cumpria pena de 30 anos por acusações diversas, que vão desde fraude até extremismo, esta a mais grave. Ele sempre alegou que as acusações eram politicamente motivadas e frequentemente reclamava do tratamento que recebia no cárcere, dizendo inclusive que sua saúde estava debilitada por isso.

A perseguição de que era vítima levou aliados, grupos de defesa dos direitos humanos, governos estrangeiros e até a ONU (Organização das Nações Unidas) a culparem o governo russo pela morte, alguns usando a palavra “assassinato”.

Após a morte, retomou-se o debate sobre o retorno dele à Rússia, mesmo sabendo que seria preso e possivelmente morto pelo regime. A mulher dele disse que Navalny não pôde optar por uma vida tranquila no exílio porque “amava profundamente” a Rússia e acreditava no potencial do povo russo para um futuro melhor. Alegou ainda que o marido não apenas expressava essas convicções, mas as vivia intensamente, estando até mesmo disposto a sacrificar sua vida por elas.

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