Afegãs foram detidas após Taleban vetar trabalho humanitário feminino, diz ONU

Medidas discriminatórias e ilegais restringem a participação de mulheres e meninas na vida pública no Afeganistão

Após a proibição de afegãs trabalharem para a ONU (Organização das Nações Unidas), medida anunciada pelo Taleban no começo de abril, mulheres a serviço da entidade foram detidas, assediadas e sofrem restrições de movimento, segundo comunicado divulgado nesta terça-feira (9). As informações são da agência Al Jazeera.

“Esta é a mais recente de uma série de medidas discriminatórias – e ilegais – implementadas pelas autoridades de fato com o objetivo de restringir severamente a participação de mulheres e meninas na maioria das áreas da vida pública e cotidiana no Afeganistão”, afirmou a ONU.

Em dezembro passado, os talibãs proibiram o trabalho de mulheres afegãs em ONGs, levando muitas agências a suspenderem as atividades por falta de mão de obra. No início do mês passado, a organização jihadista estendeu sua proibição às mulheres que trabalham para as Nações Unidas. Devido ao veto, inclusive os homens afegãos decidiram não mais comparecer ao trabalho em solidariedade às colegas. A estimativa é de que 3,3 mil afegãos, sendo 2,7 mil homens e 600 mulheres, estejam fora de serviço.

Afegãs em centro de distribuição de comida de Herat, no Afeganistão (Foto: Sayed Bidel/Unicef)

O relatório da ONU citou a prisão em março de quatro mulheres que participaram de um protesto em Cabul contra a prisão do ativista da educação de meninas Matiullah Wesa, idealizador e líder da Pen Path, uma ONG local que viaja pelo Afeganistão levando uma escola móvel e uma biblioteca às comunidades carentes de ensino.

As Nações Unidas ainda mencionaram a prisão de uma ativista dos direitos das mulheres e seu irmão em fevereiro na província de Takhar, no norte. O relatório acrescentou que outros ativistas da sociedade civil foram libertados, supostamente sem acusações, após longos períodos de detenção arbitrária pelo serviço de inteligência do Taleban.

De acordo com a Missão de Assistência da ONU no Afeganistão (Unama), tais medidas terão efeitos desastrosos nas perspectivas de prosperidade, estabilidade e paz do Afeganistão.

O relatório também apontou execuções extrajudiciais em andamento de indivíduos afiliados ao governo anterior.

“Prisões arbitrárias e detenções de ex-funcionários do governo e membros da Força Nacional de Segurança e Defesa do Afeganistão também ocorreram em fevereiro, março e abril”, disse o relatório.

Violência

Em um relatório separado divulgado na segunda-feira (8), a ONU criticou o Taleban por realizar execuções públicas, chicotadas e apedrejamentos, e instou os fundamentalistas para que parem com tais práticas.

Nos últimos seis meses, 274 homens, 58 mulheres e dois meninos foram açoitados publicamente no Afeganistão, disse o relatório das Nações Unidas.

Misoginia

Embora tenha prometido moderação no início, o Taleban se mostrou mais engajado em enterrar qualquer resquício de progresso democrático. Com o esvaziamento em agosto de 2021 da base militar de Bagram, que durante vinte anos foi o centro do poder militar dos EUA e seus aliados no Oriente Médio, os talibãs impuseram o terror e a repressão decorrentes de uma abordagem radical da lei islâmica, a ‘Sharia’.

A misoginia é parte central nesse processo, já que o governo tem na repressão de gênero uma de suas mais autoritárias marcas. Mulheres não podem estudar, trabalhar nem sair de casa desacompanhadas de um homem. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas contribui para o empobrecimento da população afegã.

A perseguição implacável do Taleban às mulheres não as tirou somente da escola. Também fez os níveis de emprego feminino no Afeganistão caírem acentuadamente, de acordo com dados divulgados recentemente pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Um estudo da entidade, intitulado Emprego no Afeganistão em 2022: uma rápida avaliação de impacto, diz que, no quarto trimestre de 2022, o emprego feminino teve redução de 25% na comparação com o segundo trimestre de 2021, período que antecedeu a retirada das tropas dos EUA e aliados do país e a consequente insurreição dos extremistas.

As mulheres que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão talibã seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas contribui para o empobrecimento da população afegã.

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