Irã desvia voo e impede que esposa e filha de ídolo do futebol local deixem o país

A lenda do futebol iraniano Ali Daei, que apoiou os protestos após a morte da jovem curda Mahsa Amini, acusou as autoridades iranianas de desviar um voo para impedir sua família de viajar

Um voo com destino a Dubai, que transportava a esposa e a filha do ex-capitão da seleção nacional de futebol do Irã Ali Daei, foi redirecionado na segunda-feira (26) pelas autoridades iranianas para impedir que elas deixasse o país, informou a mídia estatal. O jogador apoia abertamente os protestos antigoverno que vêm ocorrendo desde setembro na nação árabe. As informações são da agência Reuters.

Daei, que foi um dos heróis do Irã ao derrotar a Austrália em uma famosa repescagem para a Copa do Mundo de 1998, já havia manifestado apoio às manifestações após a morte de Mahsa Amini, levada sob custódia por usar o lenço islâmico de forma inadequada.

A mulher e a filha de Daei embarcaram num avião da Mahan Air em Teerã, mas a aeronave fez uma escala inesperada na ilha iraniana de Kish, onde ambas foram obrigadas a descer, segundo detalhou o ex-atleta de 53 anos, citado pela agência ISNA.

“Ninguém me deu explicações sobre este incidente. Não sei o que motivou essa decisão. Eles queriam prender um terrorista?”, disse Daei.

Ali Daei em 2019 (Foto: WikiCommons)

Após afirmar que há um “papel destrutivo” do Reino Unido nos protestos, acusação reforçada pelas prisões de cidadãos britânicos pela Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC, na sigla em inglês) no domingo (25), que fariam parte de “rede organizada” conectada à agência de inteligência britânica, Teerã está em meio a uma repressão coordenada.

O ex-goleador, que foi detentor do recorde de gols marcados a serviço de uma seleção até ser ultrapassado por Cristiano Ronaldo em 2021, é crítico ferrenho do regime iraniano e chegou a ser temporariamente detido no final de outubro por conta do seu posicionamento em defesa dos direitos das mulheres. Além disso, teve uma joalheria e um restaurante fechados.

Pena de morte

As manifestações a favor dos direitos das mulheres e contra o regime têm levado Teerã à aplicação da pena de morte. Um dos executados foi Majidreza Rahnavard, de 23 anos, enforcado em público neste mês na cidade de Mashhad, no nordeste do país. Ele foi condenado à morte sob acusação de ter esfaqueado dois membros das forças de segurança durante protestos desencadeados após o incidente que tirou a vida de Mahsa Amini.

Há ao menos mais nove execuções confirmadas, que podem acontecer a qualquer momento. Uma delas é a de um outro jogador de futebol, Amir Nasr-Azadani, acusado de envolvimento na morte de dois integrantes do Basij e de um policial. Como nos demais casos, organizações humanitárias dizem que o julgamento dele foi irregular.

Pelo menos 200 morreram nos protestos em andamento no país, marcados pela violência, de acordo com as autoridades iranianas. A estatística oficial contrasta com as estatísticas de grupos de direitos humanos estrangeiros, que calculam que o número de mortes ultrapasse 450.

Por que isso importa?

Nos últimos meses, protestos populares tomaram as ruas do Irã após a morte de Mahsa Amini, uma jovem de 22 anos que visitava Teerã, capital do país, quando foi abordada pela “polícia da moralidade” por não usar “corretamente” o hijab, o véu obrigatório para as mulheres. Sob custódia, ela desmaiou, entrou em coma e morreu três dias depois.

Os protestos começaram no Curdistão, província onde vivia Mahsa, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da república islâmica. As forças de segurança iranianas passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com relatos de dezenas de mortes.

No início de outubro, a ONG Human Rights Watch (HRW) publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando uma série de abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

De acordo com dados divulgados pela ONG Ativistas de Direitos Humanos do Irã (HRAI, na sigla em inglês), ao menos 503 pessoas morreram nas mãos de agentes estatais até o dia 19 de dezembro, entre elas 69 crianças. A entidade diz ainda que 18.452 pessoas foram detidas pelas autoridades sob a acusação de participar dos protestos.

Além dos mortos e feridos, a HRW cita os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades. Condena ainda o corte dos serviços de internet, com plataformas de mídia social bloqueadas em todo o país desde o dia 21 de setembro, por ordem do Conselho de Segurança Nacional do Irã.

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