Cinco questões que merecem atenção na cúpula da Otan que ocorre nesta semana, na Lituânia

Possível adesão da Ucrânia, impasse para o ingresso da Suécia e o aumento dos orçamentos de defesa estarão na agenda em Vilnius

Começa na próxima terça-feira (11), em Vilnius, na Lituânia, a cúpula de líderes da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). O evento ocorre em momento decisivo para a aliança militar transatlântica, que precisa lidar com os desdobramentos da guerra da Ucrânia e com a crescente ameaça da Rússia, que desde a cúpula do ano passado, em Madri, foi inserida no conceito estratégico do pacto como um risco real à segurança de seus membros.

Na cúpula desta semana serão debatidas questões pontuais cruciais para a aliança, como o ingresso de novos integrantes e o orçamento de defesa projetado para os próximos anos para cada um dos atuais membros. A Referência separou cinco dessas questões que merecem atenção no evento.

Secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg (Foto: NATO North Atlantic Treaty Organization/Flickr)
A Ucrânia será aceita como novo membro?

É extremamente improvável que a reposta para esta pergunta seja afirmativa. Kiev formalmente se candidatou a uma vaga no ano passado, mas a aliança está dividida. As nações da Europa Central são as principais entusiastas da proposta, enquanto um grupo liderado por Estados Unidos e Alemanha está hesitante.

Para aqueles contrários à proposta, pesa a declaração de Bucareste de 2008, quando a Ucrânia e a Geórgia foram convidadas a ingressar na Otan, mas não foi estabelecido um prazo para que o processo fosse finalizado. A situação só fez aumentar a tensão no entorno da Rússia, que passou a instigar conflitos nessas duas nações, com a anexação da Crimeia e o conflito separatista em Donbass em 2014.

“Os aliados mais assertivos, incluindo as nações bálticas, a Polônia e os aliados da Europa Central, sentem que a Ucrânia provou seu valor para a Otan no campo de batalha e que sua crescente proeza militar serviria bem à aliança para impedir futuras agressões russas”, diz artigo publicado pelo think tank norte-americano Center for Strategic and International Studies (CSIS).

O mais provável é que a cúpula sirva para a aliança oferecer novas garantias de segurança a longo prazo à Ucrânia, a fim de dissuadir agressões futuras da Rússia. Tal proposta incomoda a primeira-ministra da Estônia Kara Kallas, uma das principais entusiastas da ideia de ter Kiev como um membro efetivo do pacto de defesa.

Em recente entrevista ao jornal Financial Times, Kallas disse que é preciso adotar medidas “práticas e concretas” em direção à adesão ucraniana. Segundo ela, “falar sobre garantias de segurança”, como vem sendo feito pela aliança militar ultimamente, “acaba confundindo a situação.” A adesão, diz ela, é “a única garantia de segurança que realmente funciona e é muito mais barata que qualquer outra coisa.”

A novela sobre o ingresso da Suécia chegará ao fim?

A intenção da Otan era contar como a Suécia como membro já nesta cúpula, mas isso não aconteceu. A Turquia continua sendo o principal empecilho, com a Hungria também hesitante, mas disposta a dar seu “sim” tão logo Ancara o faça.

Desde maio de 2022, o presidente turco Recep Erdogan vem se mostrando um obstáculo nas pretensões suecas. Ele cobra do país escandinavo uma postura mais clara sobre o que Ancara considera “terrorismo”, referindo-se à tolerância sueca com indivíduos acusados de serem membros de milícias curdas.

Nesse sentido, Estocolmo tem mostrado muito boa vontade, com seguidas decisões judiciais em sintonia com as exigências turcas. Em dezembro de 2022, a justiça sueca decretou a extradição para a Turquia de Mahmut Tat, acusado de ligação com o PKK (Partido dos Trabalhadores Curdos), milícia curda que Ancara, EUA e União Europeia (UE) consideram uma organização extremista. Na última semana, outro homem foi condenado por ligação com a o grupo. Yahya Gungor foi sentenciado a quatro anos e seis meses de prisão e depois será extraditado.

Porém, outras demandas turcas não foram atendidas pela Justiça sueca, e o governo já afirmou mais de uma vez que não vai interferi em decisões do Judiciário. Pesam também os recentes protestos em solo sueco, devidamente autorizados por tribunais locais, que incluíram a queima de exemplares do Alcorão. Embora o aval turco esteja mais próximo do que nunca, é improvável que seja anunciado até o final da cúpula de Vilnius, na quarta-feira (12).

Os países membros vão aumentar seus gastos com defesa?

Jens Stoltenberg, o secretário-geral da Otan, já expressou o desejo de que os líderes dos países-membros comprometam um mínimo de 2% do produto interno bruto (PIB) de suas nações em gastos com defesa.

Esse compromisso já foi firmado em 2014 e vence no que vem. Porém, um relatório de 2021 divulgado pela aliança destacou que, dos 31 membros (Finlândia incluída), apenas oito atingiram a meta. E ainda há quem defenda um aumento do piso para 2,5%, caso da primeira-ministra da Estônia.

“Se você voltar para a Guerra Fria ou antes disso, não era anormal para um país gastar algo entre 5% e 10% de seu PIB em defesa”, disse à revista Newsweek James Rogers, cofundador do think tank britânico Council on Geostrategy. “Há uma discussão a ser feita sobre se os gastos no momento são suficientes, dadas as novas circunstâncias que estão surgindo ao nosso redor.”

É improvável, no entanto, que todos os países-membros atinjam o piso. Para se ter ideia da disparidade entre a realidade e o que foi acordado, Luxemburgo gasta somente 0,58% de seu PIB com defesa, enquanto a Espanha gasta 1,01%. Os dados são da rede Euronews.

Quem será o próximo secretário-geral da aliança?

Esta é uma pergunta já respondida. O mandato de Stoltenberg terminaria no dia 31 de outubro, mas já foi ampliado, e dessa forma ele completará uma década no cargo.

“Honrado pela decisão dos aliados da Otan de estender meu mandato como secretário-geral até 1º de outubro de 2024. O vínculo transatlântico entre a Europa e a América do Norte garantiu nossa liberdade e segurança por quase 75 anos, e, em um mundo mais perigoso, nossa aliança é mais importante do que nunca”, disse ele após o anúncio, em post no Twitter.

A decisão também foi celebrada pelo presidente norte-americano Joe Biden. “Com sua liderança constante, experiência e julgamento, o secretário-geral Stoltenberg conduziu nossa aliança através dos desafios mais significativos na segurança europeia desde a Segunda Guerra Mundial”, diz comunicado divulgado pela Casa Branca após o anúncio. 

Com quais novas ameaças a Otan precisa lidar?

A principal mudança no cenário de segurança europeu desde a última cúpula da Otan é o fortalecimento militar de Belarus. Importante aliado da Rússia, o país agora tem amas nucleares tática posicionadas por Moscou em seu território, e nas próximas semanas pode receber uma força adicional com a esperada chegada ao país dos mercenários do Wagner Group após o frustrado motim na Rússia.

Minsk já preparou novas instalações para receber os combatentes, e o presidente belarusso Alexander Lukashenko deixou claro que tem planos para a força paramilitar à qual concedeu abrigo. “Eu poderia usar tal unidade no exército”, afirmou o presidente de Belarus no início desta semana, em reunião com o Ministério da Defesa do país.

Se tiver liberdade de atuação em Belarus como tinha na Rússia, o Wagner pode se reconstruir, com o chefe Evgeny Prigozhin usando sua influência e seus contatos para obter armas e homens. Nos últimos meses, com a Rússia afogada em sanções que dificultam seu acesso a tecnologia militar, foram os mercenários que melhor conseguiram contornar o problema, obtendo equipamento militar por uma rota através do Mali e com acordos firmados com a Coreia do Norte.

Para a Rússia, é crucial que Belarus tenha forças armadas bem preparadas. Tal necessidade se explica pela posição geográfica do território belarusso, que faz divisa com três países da Otan: Polônia, Letônia e Lituânia. Trata-se, portanto de uma barreira crucial entre o território russo e a aliança.

A presença de Prigozhin em Minsk já preocupa a Otan, segundo a agência Al Jazeera. “Se o Wagner enviar seus assassinos em série para Belarus, todos os países vizinhos enfrentarão um perigo ainda maior de instabilidade”, alertou Gitanas Nauseda, presidente da Lituânia.

Stoltenberg, por sua vez, advertiu Putin e Lukashenko de que está atento à situação e tem suas tropas de prontidão. “Portanto, sem mal-entendidos e sem espaço para mal-entendidos em Moscou ou Minsk sobre nossa capacidade de defender nossos aliados contra qualquer ameaça potencial”, afirmou ele, de acordo com a agência Associated Press (AP).

Tags: