China amplia censura online, com regras mais rígidas para mídias sociais e streaming

Nova lei exige que operadores e moderadores de plataformas filtrem comentários "nocivos" em notícias na internet

A China deu um passo adiante na sua conhecida repressão online. A partir de 15 de dezembro, as mídias sociais locais e as plataformas de vídeo deverão aprovar todos os comentários relacionados a notícias antes de serem colocados no ar, medida que tem como objetivo criar um firewall contra conteúdo classificado como “prejudicial” pelo governo. As informações são da rede Radio Free Asia.

A nova determinação, divulgada pelo órgão regulador da internet chinês na quarta-feira (16), é uma versão atualizada da polêmica Lei de Cibersegurança, em vigor desde 2017 no país. Há cinco anos, ela impõe restrições ao que os usuários da rede podem compartilhar, particularmente conteúdo que potencialmente prejudique a “honra nacional”, “perturbe a ordem econômica e social” ou intencione “derrubar o sistema socialista”.

“Onde quer que os comentários sejam permitidos em notícias, um sistema deve ser configurado para revisá-los antes da postagem”, disse uma diretiva da Administração do Ciberespaço da China (CAC, da sigla em inglês), a agência nacional de regulação, censura, supervisão e controle da rede mundial de computadores.

Mulher chinesa checa seu smartphone (Foto: Unsplash/Divulgação)

A diretiva acrescentou que as regras irão valer para todas as plataformas que tenham capacidade para exibir opinião pública, podendo ser em comentários em forma de texto, imagens, áudio, vídeo e até emojis.

Para se adequar à nova lei, os provedores deverão criar equipes de moderação que trabalharão exclusivamente na revisão e edição dos comentários. Além disso, terão de gerenciar um sistema de “classificação de usuários”, que irá avaliar o comportamento dos internautas nos espaços virtuais.

Operadoras que descumprirem a norma enfrentarão advertências e estarão sujeitas a punições, como multas e suspensão do recurso de comentários ou mesmo de todo o serviço.

O novo regulamento do CAC ocorre em meio ao crescente descontentamento público com os rígidos controles sanitários estabelecidos pela política “Zero Covid” do governo Xi Jinping, que teve como a mais nova vítima uma bebê de apenas quatro meses de idade, cuja morte foi relatada na internet pelo pai da criança.

Em outubro, um estudo divulgado pela ONG norte-americana Freedom House apontou Beijing como “o pior ambiente para a liberdade na internet”, conforme o índice anual da liberdade global na rede. Segundo o documento, o país se manteve no topo ao reforçar seu controle sobre o setor de tecnologia, à medida que estabeleceu “novas regras que exigem que as plataformas usem seus sistemas algorítmicos para promover a ideologia do Partido Comunista Chinês (PCC)”. 

Por que isso importa?

Na China, o simples fato de citar a democracia leva à repressão do Estado. Algo que ficou claro nos protestos de 2019 em Hong Kong, que até hoje rendem prisões e denúncias contra seus organizadores e participantes. Segundo a ONG Hong Kong Watch, baseada no Reino Unido, até o dia 31 de janeiro deste ano, 10.294 pessoas foram presas por motivação política em Hong Kong, sendo que cerca de 2,3 mil foram posteriormente processadas pelo Estado.

A internet também deixa claro que os valores democráticos não têm vez na China, que bloqueia as redes sociais dos EUA e utiliza suas próprias versões, estas submetidas à censura do PCC. É o caso do Weibo. Lá, uma postagem do jornal estatal People’s Daily sobre o ataque do Ministério das Relações Exteriores à democracia norte-americana recebeu inicialmente cerca de 2,7 mil comentários. Depois de a censura começar a agir, restaram pouco mais de uma dúzia.

E a repressão imposta pela China a seus cidadãos já ultrapassa as próprias fronteiras. Artigo publicado pela revista Foreign Policy em outubro do ano passado mostra como o PCC, fazendo uso da lei de segurança nacional de Hong Kong, tem poder para calar críticos que vivem a milhares de quilômetros de distância.

Aconteceu, por exemplo, com o empresário britânico Bill Browder, alertado pelo Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido a não viajar para países que honrem os tratados de extradição com Hong Kong. Ativista em defesa de sanções contra funcionários do governo britânico cúmplices de abusos dos direitos humanos, ele poderia ser preso e extraditado para o território controlado pela China por seu discurso crítico contra os abusos cometidos pelo PCC.

Isso porque a lei de segurança nacional prevê a acusação de qualquer pessoa, em qualquer lugar, por discurso considerado hostil aos interesses de segurança chineses. “Os ditames da China afetam os esportes, Hollywood, o mundo editorial, os meios de comunicação e o jornalismo, o ensino superior, as empresas de tecnologia e mídia social e muito mais”, diz o artigo.

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