EUA e Austrália cobram transparência em novo acordo de segurança entre China e Ilhas Salomão

Desde o rompimento de laços diplomáticos com Taiwan, as relações entre Honiara e Beijing têm prosperado, levantando preocupações na região

Os Estados Unidos, a Austrália e o líder da oposição nas Ilhas Salomão fizeram um pedido conjunto à China e ao governo do país insular para que tornem público um acordo de cooperação policial assinado recentemente. A solicitação enfatiza a preocupação de que esse tratado possa ter um impacto negativo na estabilidade da região. As informações são da rede Radio Free Asia.

Durante sua segunda visita oficial à China desde a mudança de reconhecimento diplomático de Taiwan para Beijing em 2019, o primeiro-ministro das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare, participou da assinatura de nove acordos entre os dois países na segunda-feira (10). Entre esses acertos estava incluído um pacto de cooperação policial, enquanto os líderes chineses se comprometeram a fornecer mais auxílio à nação insular, que enfrenta dificuldades econômicas.

Na ocasião do encontro, o presidente Xi Jinping disse que a China está pronta para compartilhar com as Ilhas Salomão as oportunidades de desenvolvimento trazidas pela modernização chinesa e ajudar Honiara a alcançar desenvolvimento, revitalização e estabilidade de longo prazo.

O primeiro-ministro das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare, se reuniu com o presidente chinês Xi Jinping em Beijing (Foto: Ministry of Foreign Affairs of the People’s Republic of China/Reprodução Twitter)

Matthew Wale, líder da oposição nas Ilhas Salomão, expressou a necessidade de o governo de Sogavare em tornar público todos os nove acordos assinados com a China, trazendo clareza e transparência para a população sobre seus termos e implicações. Ele afirmou que alguns ministros do gabinete do premiê não tinham conhecimento do escopo dos tratados que seriam assinados com o governo chinês.

Wale ressaltou que as Ilhas Salomão estão se destacando na região devido à “velocidade e fôlego” com que estão concluindo essas negociações.

Nesta quinta-feira (13), um porta-voz da embaixada dos EUA nas Ilhas Salomão, com sede em Papua Nova Guiné, expressou preocupações gerais sobre a expansão do aparato de segurança e vigilância da China para além de suas próprias fronteiras. O porta-voz destacou a importância de divulgar imediatamente os detalhes desses acordos, a fim de “aumentar a transparência e informar as discussões sobre os possíveis impactos na segurança regional”.

Dentro da lei

Durante a coletiva de imprensa regular do Ministério das Relações Exteriores da China, o porta-voz Wang Wenbin afirmou na quarta-feira (12) que o acordo de cooperação policial está em conformidade com a lei internacional e práticas comuns.

Ele destacou que a cooperação policial com a China tem desempenhado um papel positivo na promoção da segurança e estabilidade das Ilhas Salomão. Essa declaração foi feita como resposta aos questionamentos sobre o referido acordo durante a coletiva de imprensa.

A ministra das Relações Exteriores da Austrália, Penny Wong, enfatizou que há um consenso entre as nações insulares do Pacífico, incluindo a Austrália e a Nova Zelândia, de que a segurança na região deve ser gerenciada internamente por meio de organizações diplomáticas, como o Fórum das Ilhas do Pacífico.

Durante uma entrevista coletiva em Jacarta, na quarta-feira, Wong destacou a importância da transparência em relação ao significado desse acordo e ressaltou o desejo de discuti-lo no âmbito do Fórum das Ilhas do Pacífico. Essa abordagem visa garantir a estabilidade regional.

Influência chinesa crescente

No final de março de 2022, a China havia conquistado uma importante vitória na disputa por influência com o Ocidente ao firmar um acordo de segurança com Honiara. Na ocasião, vazou o que seria uma carta de intenções, segundo a qual Beijing estabeleceria uma base militar nas Ilhas Salomão. 

No documento, uma empresa chinesa de engenharia “demonstra intenção de estudar a oportunidade de desenvolver projetos navais e de infraestrutura em terrenos arrendados para a Marinha do Exército de Libertação Popular (ELP), para a Província de Isobel, com direitos exclusivos por 75 anos.”

Na mesma época em que a carta veio a público, Sogavare confirmou que estava prestes a assinar o acordo de segurança com a China. Na ocasião, definiu como “insultantes” as preocupações australianas e neozelandesas de que o pacto poderia causar instabilidade na segurança da região.

Pouco depois do anúncio, Wang Wenbin afirmou que o acordo já havia sido assinado. Ele não especificou quando e onde ocorreu a assinatura, que também foi confirmada pela embaixada chinesa em Honiara.

A visita do premiê salomônico a Beijing nesta semana soa como uma resposta chinesa à Austrália, que no final de junho propôs a ampliação do acordo de cooperação militar entre os dois países. Firmado em 2017, o pacto prevê o envio de tropas australianas adicionais à nação insular, onde Camberra mantém mais de 200 soldados desde 2021, a pedido do governo local.

Por que isso importa?

As Ilhas Salomão vivem um período de intensa agitação social, que especialistas associam a questões étnicas e históricas, à corrupção estatal e ao movimento do governo para estreitar laços com a China. Há três anos, o governo local trocou a aliança diplomática com Taiwan por uma com Beijing.

Para James Batley, um ex-alto comissário australiano para as Ilhas Salomão e especialista em assuntos sobre Ásia-Pacífico da Universidade Nacional Australiana, o desagrado da população em relação à aproximação com a China serviu como gatilho para a desordem popular que explodiu em novembro de 2021.

“Não é política externa em si, mas acho que essa mudança diplomática alimentou as queixas pré-existentes e, em particular, a sensação de que os chineses interferiram na política nas Ilhas Salomão, que o dinheiro chinês de alguma forma fomentou a corrupção, distorceu a forma como a política funciona nas Ilhas Salomão”, disse Batley.

A relação comercial com a China é considerada particularmente predatória pela população local. Mais da metade de todos os frutos do mar, madeira e minerais extraídos do Pacífico em 2019 foi para a China. A estimativa é de que esse processo tenha movimentado US$ 3,3 bilhões, apontou uma análise de dados comerciais do jornal britânico The Guardian.

Para alimentar e gerenciar a população de quase 1,4 bilhão de habitantes, a China tirou do Pacífico mais recursos do que os dez países da região juntos. Nas Ilhas Salomão e em Papua Nova Guiné, por exemplo, mais de 90% do total de madeira exportada foi para os chineses.

Os dados não levam em consideração as exportações ilícitas. Nas Ilhas Salomão, pelo menos 70% das toras são exportadas de madeira ilegal. A falta de leis na China contra esse tipo de importação absorvem o envio devido à alta demanda e proximidade com a região.

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