Facebook anuncia que apagará vídeos antigos e ameaça memória dos protestos em Hong Kong

Mudança da Meta afetará transmissões arquivadas, colocando em risco registros históricos da onda pró-democracia de 2019

A Meta, proprietária do Facebook, confirmou que vai apagar vídeos antigos armazenados em sua plataforma a partir do dia 5 de junho deste ano. A medida, que afeta transmissões ao vivo arquivadas em geral, trouxe especial preocupação para jornalistas e ativistas de Hong Kong, que alertam para o risco de desaparecerem conteúdos valiosos sobre os protestos pró-democracia realizados na cidade em 2019. As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).

Em resposta ao anúncio, a Associação de Jornalistas de Hong Kong emitiu um apelo urgente solicitando que profissionais da mídia e cidadãos façam backup dos vídeos imediatamente, para evitar a perda definitiva de um material histórico considerado fundamental. Muitos desses registros, hoje proibidos no território devido às rígidas leis de segurança nacional, estão armazenados exclusivamente nas redes sociais.

Fotografia flagra combate entre forças policiais de Hong Kong e manifestantes pró-democracia em Sheung Wan, julho de 2019 (Foto: CreativeCommons/Studio Incendo)

“Como a mídia de Hong Kong dependeu fortemente do Facebook Live para cobrir os protestos, a Associação de Jornalistas pede agora aos responsáveis pelos veículos convencionais, independentes, cidadania e editores online que façam backup de seus vídeos o mais rápido possível”, disse a entidade em comunicado.

Um repórter local, identificado apenas como Ken por receio de represálias, lamentou o possível impacto dessa decisão. Segundo ele, grande parte da cobertura original dos protestos corre risco de sumir completamente da internet: “É como se perdêssemos uma biblioteca online. A menos que alguém decida fazer backup e colocar tudo novamente online, não haverá mais como encontrar essa história no futuro”.

Para o comentarista de mídia To Yiu-ming, a preservação desses conteúdos históricos não pode depender das redes sociais. “Se você quer preservar o registro histórico, terá que utilizar métodos menos convenientes e investir tempo e dinheiro”, recomendou To.

O Facebook esclareceu que os usuários poderão solicitar uma extensão de até seis meses antes da exclusão definitiva.

Por que isso importa?

Após ser transferido do domínio britânico para o chinês, em 1997, Hong Kong passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Entretanto, apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa de 2019.

A resposta chinesa aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que a partir de junho de 2020 deu ao governo de Hong Kong o poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. O antigo texto vinha sendo usado até março de 2024, quando uma nova lei, ainda mais dura, foi aprovada.

A aprovação do novo texto legal atendeu a uma determinação da Lei Básica, uma espécie de Constituição do território. Ela exigia em seu artigo 23 que um mecanismo legal próprio fosse estabelecido para substituir o anterior, este imposto emergencialmente pela China. A nova versão da lei pune crimes como traição, insurreição, incitação de membros das Forças Armadas ao motim e conluio com forças externas.

Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação vêm diminuindo cada vez mais em Hong Kong desde que a antiga lei entrou em vigor, ampliando a repressão aos dissidentes. Já as autoridades locais reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território.

Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.

Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada.”

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