Contra influência da China, EUA aceleram reabertura de embaixada nas Ilhas Salomão

Washington prepara uma missão diplomática interina no primeiro momento, com planos de ampliar a equipe posteriormente

Está em fase avançada o plano do governo norte-americano de reabrir sua embaixada nas Ilhas Salomão, parte da estratégia de Washington para conter a crescente influência da China na região do Indo-Pacífico. As informações são da agência Associated Press (AP).

O plano do Departamento de Estado dos EUA é restabelecer uma missão diplomática interina no mesmo edifício que abrigava a anterior, em Honiara. Mais tarde, a equipe será ampliada, embora não tenham sido divulgadas datas para cada etapa do processo. O custo anual inicial será de US$ 1,8 milhão.

O Congresso norte-americano foi notificado dos planos de reabertura da embaixada em fevereiro do ano passado, conforme as Ilhas Salomão vinham estreitando os laços com Beijing. A antiga missão diplomática dos EUA foi encerrada em 1993, em meio à redução global de postos que acompanhou o fim da Guerra Fria.

Influência chinesa crescente

O maior motivo de preocupação dos EUA e de seus aliados no que tange à pequena nação insular surgiu no final de março de 2022, quando vazou uma carta de intenções indicando que o governo chinês planeja estabelecer uma base militar nas Ilhas Salomão. 

No documento, uma empresa chinesa de engenharia “demonstra intenção de estudar a oportunidade de desenvolver projetos navais e de infraestrutura em terrenos arrendados para a Marinha do Exército de Libertação Popular (ELP), para a Província de Isobel, com direitos exclusivos por 75 anos”.

Na mesma época em que a carta veio a público, o premiê das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare, confirmou que estava prestes a assinar um acordo de segurança com a China. Na ocasião, ele definiu como “insultantes” as preocupações australianas e neozelandesas de que o pacto poderia causar instabilidade na segurança da região.

Pouco depois do anúncio, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, afirmou que o acordo já havia sido assinado. Ele não especificou quando e onde ocorreu a assinatura, que também foi confirmada pela embaixada chinesa em Honiara.

Premiês das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare (esq.), e da China, Li Keqiang (Foto: fmprc.gov.cn)

Diante desses desdobramentos, o Departamento de Estado dos EUA enviou ao Congresso uma notificação, datada de 23 de dezembro de 2022, na qual destacou o caráter de urgência do processo de ampliação das relações diplomáticas e comerciais com as Ilhas Salomão.

“Estamos vendo esse vínculo enfraquecer à medida que a República Popular da China busca agressivamente envolver as elites políticas e empresariais das Ilhas Salomão, utilizando um padrão familiar de promessas extravagantes, empréstimos de infraestrutura dispendiosos em perspectiva e níveis de dívida potencialmente perigosos”, diz o documento.

Ainda de acordo com a notificação, “a ausência de uma embaixada restringiu severamente nossa capacidade de nos envolver com este país estrategicamente situado com entusiasmo e precisão”. O texto destaca os principais setores em que Washington deve investir na nação insular: segurança, governança democrática e economia.

Em outubro do ano passado, Washington já havia conseguido quebrar a resistência das Ilhas Salomão, convencendo o governo do primeiro-ministro Manasseh Sogavare a assinar um acordo que engloba também outras 13 nações insulares do Pacífico.

Porém, os salomônicos só cederam após a remoção do documento de todas as referências indiretas feitas à China. “Houve algumas referências que nos colocaram em uma posição em que teríamos que escolher lados. E não queremos ser colocados em uma posição em que tenhamos que escolher lados”, disse na ocasião o ministro das Relações Exteriores Jeremiah Manele.

Por que isso importa?

As Ilhas Salomão vivem um período de intensa agitação social, que especialistas associam a questões étnicas e históricas, à corrupção estatal e ao movimento do governo para estreitar laços com a China. Há três anos, o governo local trocou a aliança diplomática com Taiwan por uma com Beijing.

Para James Batley, um ex-alto comissário australiano para as Ilhas Salomão e especialista em assuntos sobre Ásia-Pacífico da Universidade Nacional Australiana, o desagrado da população em relação à aproximação com a China serviu como gatilho para a desordem popular que explodiu em novembro de 2021.

“Não é política externa em si, mas acho que essa mudança diplomática alimentou as queixas pré-existentes e, em particular, a sensação de que os chineses interferiram na política nas Ilhas Salomão, que o dinheiro chinês de alguma forma fomentou a corrupção, distorceu a forma como a política funciona nas Ilhas Salomão”, disse Batley.

A relação comercial com a China é considerada particularmente predatória pela população local. Mais da metade de todos os frutos do mar, madeira e minerais extraídos do Pacífico em 2019 foi para a China. A estimativa é de que esse processo tenha movimentado US$ 3,3 bilhões, apontou uma análise de dados comerciais do jornal britânico The Guardian.

Para alimentar e gerenciar a população de quase 1,4 bilhão de habitantes, a China tirou do Pacífico mais recursos do que os dez países da região juntos. Nas Ilhas Salomão e em Papua Nova Guiné, por exemplo, mais de 90% do total de madeira exportada foi para os chineses.

Os dados não levam em consideração as exportações ilícitas. Nas Ilhas Salomão, pelo menos 70% das toras são exportadas de madeira ilegal. A falta de leis na China contra esse tipo de importação absorvem o envio devido à alta demanda e proximidade com a região.

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