Uigures lembram dois anos desde que genocídio em Xinjiang pela China foi reconhecido

Em dezembro de 2021, um tribunal independente em Londres concluiu que Beijing coordenava esforços para apagar a comunidade muçulmana

Na segunda-feira (11), celebraram-se os dois anos desde que um tribunal independente em Londres concluiu que o governo chinês estava perpetrando genocídio contra os uigures, comunidade predominantemente muçulmana que vive no noroeste do país. Ativistas e parlamentares norte-americanos lembraram da data em evento na Câmara dos Representantes dos EUA. As informações são da rede Radio Free Asia.

O tema é sensível em território chinês. Beijing enfrenta acusações de violações graves dos direitos humanos contra os uigures, incluindo detenções em massa, reeducação forçada, controle de natalidade e assimilação cultural em Xinjiang. Muitos especialistas e organizações internacionais, como o Tribunal Uigur, consideram essas ações como genocídio.

Em 9 de dezembro de 2021, o Tribunal Uigur expressou estar “satisfeito” com a constatação de que Beijing adotou uma “política deliberada, sistemática e concertada para otimizar a população” dos uigures no extremo oeste de Xinjiang, província chinesa.

Quando o julgamento foi anunciado, a China contestou a iniciativa. “Beijing condena e despreza as audiências”, disse à época o porta-voz do governo em Xinjiang, Xu Guixiang. “Esta é uma violação total da lei internacional, grave profanação das vítimas de um genocídio real e séria provocação a todos os povos étnicos de Xinjiang”.

Uigur no mercado de gado na cidade de Kashgar, na província de Xinjiang (Foto: WikiCommons)

No entanto, as políticas tinham como objetivo reduzir as taxas de natalidade, apagar a cultura uigur e assimilar a minoria étnica predominantemente muçulmana por meio de internamento e relocação forçada. O presidente chinês, Xi Jinping, foi relacionado nessas medidas.

Na celebração que ocorreu na Sala Caucus da presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, os ativistas uigures destacaram a importância de reconhecer a gravidade do que está acontecendo em Xinjiang. Além disso, enfatizaram a necessidade urgente de tomar medidas tangíveis para interromper essa situação.

“É o momento de todos nós demandarmos o fim dessa situação comum”, afirmou a ativista e especialista em direitos humanos Kelley Currie durante a celebração do segundo aniversário da decisão do Tribunal Uigur sobre o genocídio. “É hora de traduzirmos nossas palavras em ações proporcionais”, acrescentou a ex-embaixadora dos EUA para questões globais de gênero.

Omer Kanat, presidente executivo do Congresso Mundial Uigur e diretor do Projeto de Direitos Humanos Uigures, enfatizou a importância de homenagear as vítimas do genocídio uigur e reconhecer os sobreviventes durante o evento. Ele ressaltou a necessidade de ações imediatas para responsabilização, dissuasão e uma “resposta humanitária efetiva”.

A deputada republicana da Califórnia, Young Kim, expressou compreensão pela situação dos uigures devido à sua experiência familiar, uma vez que tem parentes que fugiram da Coreia do Norte para a Coreia do Sul.

Ela enfatizou a necessidade de agir em relação ao genocídio uigur, destacando a importância da Lei de Política Uigur, que busca, entre outras medidas, introduzir um programa de língua uigur para diplomatas norte-americanos. O projeto ainda não passou no Congresso.

Medidas já aprovadas

Os Estados Unidos aprovaram duas leis para abordar as violações contra a minoria muçulmana. Uma delas é a Lei de Prevenção do Trabalho Forçado Uigur (UFLPA, na sigla em inglês), que instrui a Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA a apoiar a proibição de importação de produtos fabricados total ou parcialmente com trabalho forçado na China, especialmente em Xinjiang.

Além disso, no final de maio, foi introduzida uma lei bipartidária chamada Lei de Responsabilidade e Sanções do Genocídio Uigur. Essa lei fortalece ainda mais as leis existentes, impondo novas sanções a entidades chinesas e exigindo que as empresas revelem quaisquer vínculos que tenham com as cadeias de suprimentos relacionadas a Xinjiang.

Há também uma proposta chamada Sanctioning Supporters of Slave Labor Act (Sancionando os apoiadores da Lei do Trabalho Escravo, em tradução literal), permitiria que agências governamentais norte-americanas impusessem sanções secundárias a empresas e indivíduos que realizassem transações com entidades sancionadas, como a Xinjiang Production and Construction Corps (XPCC), a maior empresa estatal na Região Autônoma Uigur de Xinjiang.

Caso aprovada, qualquer empresa estrangeira que fechar negócios com essas entidades ficaria proibida de fazer parcerias com empresas americanas e teria seus ativos em contas bancárias nos EUA congelados, de acordo com o gabinete do senador Marco Rubio, um dos dois legisladores por trás da iniciativa.

Por que isso importa?

A província de Xinjiang faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.

Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.

O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.

A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século”.

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