O Novaya Gazeta, mais antigo jornal independente russo, anunciou o lançamento de uma nova versão, esta europeia, para fugir da repressão doméstica imposta aos meios de comunicação na Rússia. As informações são do jornal independente The Moscow Times.
Comandado por Dmitry Muratov, vencedor do Prêmio Nobel da Paz, o Novaya Gazeta anunciou no final de março que suspenderia suas atividades temporariamente na Rússia, em virtude da censura estatal em meio à guerra na Ucrânia.
O periódico disse na ocasião que recebeu advertências do governo de que seria alvo de ações judiciais que poderiam ocasionar sua extinção caso mantivesse a linha editorial independente.
Agora, a decisão de lançar uma edição europeia, totalmente desconectada da russa, é uma forma de manter a marca viva. “Não haverá ninguém trabalhando para Novaya Gazeta e Novaya Gazeta Europe ao mesmo tempo”, disse o editor-chefe da nova publicação, Kirill Martynov. “Teremos nosso próprio conselho editorial e diretrizes”.
Enquanto Martynov comandará o jornal de Riga, na Letônia, onde vive, os demais jornalistas a serviço do periódico serão antigos colaboradores que passaram a viver no exterior. O novo título cobrirá assuntos tanto em russo quanto em inglês, com a possibilidade de lançamento de uma edição em letão.
“Queremos mostrar à comunidade local que não temos esse complexo imperialista; não esperamos que as pessoas falem russo nos lugares que visitamos”, disse o editor-chefe. “Acreditamos que nossos leitores são pessoas que se preocupam com o destino da Rússia, os eventos atuais e a catástrofe que testemunhamos agora”.
Por que isso importa?
Organizações não-governamentais, veículos de imprensa e os colaboradores de ambos têm sido o principal alvo da repressão do presidente Vladimir Putin, com o respaldo da Justiça do país. A perseguição se escora na “lei do agente estrangeiro”, que foi aprovada em 2012 e modificada diversas vezes, dando às autoridades o poder de acessar todas as informações privadas das instituições e indivíduos rotulados.
A designação “agente estrangeiro” carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. Entidades listadas também são obrigadas a rotular com o selo de “agente estrangeiro” todo conteúdo que venham a divulgar, algo que afeta particularmente as organizações de mídia.
Órgãos e indivíduos que não atendam às exigências impostas pela lei podem pegar pena de até dois anos de prisão, de acordo com o código penal russo, e as organizações podem ser proibidas de funcionar. A classificação também afasta potenciais parceiros comerciais e anunciantes, muitas vezes sufocando financeiramente as instituições listadas.
Tal sistema repressivo tem sido a principal arma do Kremlin para calar os críticos, levando a ordens de prisão, casos de exílio forçado e ao fechamento de entidades.
A censura na Rússia, que já era forte antes da invasão da Ucrânia por tropas russas, tem se intensificado durante a guerra. Em março, o Legislativo aprovou um projeto de lei que criminaliza a distribuição do que o governo vier a considerar “notícias falsas” sobre operações militares russas.
De acordo com o texto legal, passa a ser proibido publicar conteúdo “contra o uso de tropas russas para proteger os interesses da Rússia” ou “para desacreditar tal uso”, o que prevê uma pena de até três anos de prisão. A mesma punição se aplica àqueles que venham a pedir sanções ao país.
Em certos casos, o artigo prevê pena máxima de até dez anos de prisão, mas pode haver agravantes que venham a aumentar a sentença. Nos casos que a Justiça considere terem gerado “consequências sérias”, a punição sobe para até 15 anos. As nova lei será inserida em um artigo separado no Código Penal russo