Advogados que defenderam críticos do governo são alvo de repressão em Belarus

Mikhail Kirilyuk, que defendeu manifestantes e é uma voz crítica a Lukashenko, teve de deixar o país para não ser preso

O advogado belarusso Mikhail Kirilyuk revelou ter recebido uma mensagem alarmante de uma pessoa próxima ligada aos serviços de segurança do país no ano passado, que o obrigou a mudanças drásticas para proteger a família e carreira. Na mensagem, Kirilyuk, que defendeu manifestantes antigovernamentais e é uma voz crítica ao presidente Alexander Lukashenko, foi orientado a deixar Belarus, segundo a agência Reuters.

De acordo com o advogado, o texto foi enviado em outubro de 2020 por um aplicativo de mensagens criptografadas. A mensagem continha um aviso: se ficasse, Kirilyuk seria preso e teria sua licença profissional cassada.

Ele partiu logo em seguida com seus pais e filhos pequenos para a Polônia, país que não poupa críticas ao regime de Lukashenko. Em fevereiro, o Ministério da Justiça de Belarus revogou a licença de Kirilyuk, com base em um documento do tribunal de Minsk relacionado ao seu recurso frustrado.

Mikhail Kirilyuk fugiu para a Polônia e teve sua licença profissional cassada (Foto: National Anti-Crisis Management.org/Divulgação)

Em um comunicado à imprensa em fevereiro, o órgão público alegou que Kirilyuk havia feito declarações públicas “inaceitáveis” que continham comentários “rudes” e “sem tato” sobre representantes do Estado, sem identificá-los.

Kirilyuk, de 38 anos, disse acreditar que a ação contra ele tem motivação política devido aos clientes que representou e como consequência de seus comentários públicos críticos. O advogado justificou que deixou sua terra natal porque “não queria ser preso” e que não vai voltar para casa até que Lukashenko deixe o cargo.

Padrão de intimidação

O relato de Kirilyuk corrobora com o que outros seis advogados belarussos, bem como organizações internacionais que representam a profissão e grupos de direitos humanos, dizem ser um “padrão de intimidação e repressão contra advogados por autoridades do país”. Tais atos incluem processos criminais e disciplinares contra advogados e cassação de licenças.

Sete advogados disseram que suas licenças foram retiradas depois de defenderem manifestantes, contrariarem autoridades ou resistirem ao que eles disseram ser uma pressão sobre sua profissão. Diversos profissionais relatam que as autoridades monitoraram reuniões confidenciais com clientes ou obstruíram seus trabalhos.

Em março, o presidente disse que era necessário “colocar as coisas em ordem” na profissão, de acordo com o jornal estatal Belarus Today. O Ministério da Justiça, por sua vez, disse que a supervisão da advocacia é implementada de acordo “com o princípio de independência da defesa e não interferência nas atividades profissionais dos advogados”.

O órgão governamental acrescentou que tem o poder de rescindir as licenças legais em circunstâncias estipuladas por lei. Justificou, ainda, que as decisões de rescindir as licenças de vários advogados neste ano ocorreram porque eles cometeram “violações graves da legislação de licenciamento”, requisitos e condições de licenciamento, ou se envolveram em condutas que “desacreditaram” a profissão.

Por que isso importa?

Alexander Lukashenko está no poder desde 1994. De acordo com os dados oficiais, ele foi eleito recentemente, em agosto de 2020, com 79,7% dos votos, enquanto Sviatlana Tsikhanouskaia recebeu 6,8%. O resultado é contestado por observadores e pela comunidade internacional, e milhões de pessoas foram às ruas para contestar o resultado.

Desde então, o país testemunha uma crise de direitos humanos “sem precedentes”. Existem fortes indícios de desaparecimentos, tortura e maus-tratos como forma de intimidação e assédio contra cidadãos. A própria Tsikhanouskaia optou por deixar o país com seus dois filhos após a brutal repressão às manifestações pacíficas que sucederam a eleição.

O desgaste com o atual governo, que já se prolonga há anos, acentuou-se em 2020 devido à forma como ele lidou com a pandemia, que chegou a chamar de “psicose”. Em determinado momento, o presidente recomendou “vodka e sauna” para tratar a doença.

A porta-voz do presidente, Natalya Eismont, afirmou em 2019, na televisão estatal, que a “ditadura é a marca” do governo de Belarus.

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