Cantora belarussa vai a julgamento por rejeitar bolsa de estudos oferecida por ditador

Patrytsia Svitsina estava na mira das autoridades e teria recentemente "confessado" participação em atos contra o governo

Começará em 1º de agosto o julgamento da cantora belarussa Patrytsia Svitsina, acusada de “participar ativamente de ações que perturbam descaradamente a ordem social”. Em 2020 ela recusou uma bolsa de estudos oferecida pelo ditador Alexander Lukashenko e desde então era visada pelas repressoras autoridades de Belarus. As informações são da rede Radio Free Europe (RFE).

A bolsa de estudos é oferecida a jovens belarussos de talento, mas Svitsina disse que não a aceitaria por “princípios morais”. Aluna do departamento de etnologia e folclore da Universidade Estatal Belarussa, em Minsk, ela se manifestou publicamente sobre a recusa, que ocorreu em meio aos protestos populares contra o regime autoritário de Lukashenko.

Então, em maio deste ano, foi publicado um vídeo no aplicativo de mensagens Telegram no qual a cantora admite ter participado de protestos populares contra o ditador após ele vencer as eleições presidencial de 2020. A acusação foi formalizada com base na “confissão” de que esteve nas manifestações.

Grupos de direitos humanos, entretanto, dizem que confissões como a de Svitsina são obtidas mediante coação, uma forma de justificar julgamentos forjados pelo governo contra dissidentes. A cantora está presa desde 16 de junho, de acordo com a ONG Viasna.

A justiça de Belarus ainda acusa Svitsina de publicar informações negativas sobre a guerra da Ucrânia desencadeada pela invasão russa. Belarus é um importante aliado da Rússia e, como Moscou, tem reprimido manifestações contrárias ao conflito ou à atuação das forças russas.

Presidente da Belarus Alexsander Lukashenko, julho de 2017: último ditador da Europa (Foto: Flickr/OSCE)
Por que isso importa?

Belarus testemunha uma crise de direitos humanos sem precedentes, com fortes indícios de desaparecimentos, tortura e maus-tratos como forma de intimidação e assédio contra seus cidadãos. Dezenas de milhares de opositores ao regime de Lukashenko, no poder desde 1994, foram presos ou forçados ao exílio desde as controversas eleições no ano passado.

O presidente, chamado de “último ditador da Europa”, parece não se incomodar com a imagem autoritária, mesmo em meio a protestos populares e desconfiança crescente após a reeleição de 2020, marcada por fortes indícios de fraude. A porta-voz do presidente Natalya Eismont chegou a afirmar em 2019, na televisão estatal, que a “ditadura é a marca” do governo de Belarus.

Desde que os protestos populares tomaram as ruas do país após o controverso pleito, as autoridades belarussas têm sufocado ONGs e a mídia independente, parte de uma repressão brutal contra cidadãos que contestam os resultados oficiais da votação. A organização de direitos humanos Viasna diz que há atualmente quase 1,5 mil prisioneiros políticos no país.

O desgaste com o atual governo, que já se prolonga há anos, acentuou-se em 2020 devido à forma como ele lidou com a pandemia, que chegou a chamar de “psicose”. Em determinado momento, o presidente recomendou “vodka e sauna” para tratar a doença.

A violenta repressão imposta por Lukashenko levou muitos oposicionistas a deixarem o país. Aqueles que não fugiram são perseguidos pelas autoridades e invariavelmente presos. É o caso de Sergei Tikhanovsky, que cumpre uma pena de quase 20 anos de prisão sob acusações consideradas politicamente motivadas. Ele é marido de Sviatlana Tsikhanouskaia, candidata derrotada na eleição presidencial e hoje exilada.

Já o distanciamento entre o país e o Ocidente aumentou com a guerra na Ucrânia, vez que Belarus é aliada da Rússia e permitiu que tropas de Moscou usassem o território belarusso para realizar a invasão.

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