Guerra gera êxodo de empresas e cria problemas para o consumidor russo

McDonald's, Apple, Toyota, Mastercard, Visa e Netflix são algumas companhias que deixam de oferecer produtos e serviços na Rússia

Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 24 de fevereiro, mais de 300 empresas ocidentais anunciaram que deixaram de operar em território russo, seja de maneira temporária ou definitiva. O levantamento foi feito pela Universidade de Yale, nos EUA. Uma debandada que custará caro ao consumidor russo, privado de produtos em setores diversos, como entretenimento, tecnologia, automobilístico, vestuário e geração de energia. Mas que também pode afetar o Ocidente, sobretudo nos casos do gás e do petróleo.

Pensando na economia russa, o maior impacto será causado pelo êxodo das empresas do setor de geração de energia, que já começaram a suspender sua atuação no país. Nesse caso, destaque para a BP, empresa britânica de gás e petróleo que cancelou um investimento de US$ 14 bilhões na empresa estatal russa Rosneft, segundo a rede Voice of America (VOA).

Loja do McDonald’s na Rússia (Foto: Wikimedia Commons)

Quem também optou por suspender o relacionamento foi a Shell, criticada por comprar petróleo cru da Rússia depois de iniciada a guerra. Na última terça-feira (8), o diretor executivo da companhia, Ben van Beurden, se desculpou e afirmou que não mais compraria a commodity de Moscou. Também abandonou a parceira com a russa Gazprom no projeto Nord Stream 2 de fornecimento de gás natural à Europa.

Nessa área, as sanções já anunciadas por EUA e Reino Unido, que deixarão de comprar petróleo e gás da Rússia, tendem a causar problemas inclusive ao Ocidente, com a perspectiva de grande aumento global nos preços dos combustíveis. E pode piorar, vez que Moscou ameaça suspender o fornecimento de gás natural à Europa como represália.

Em um comunicado divulgado através da televisão estatal russa na última segunda (7), o vice-primeiro-ministro Alexander Novak disse que é “absolutamente claro que uma rejeição ao petróleo russo levaria a consequências catastróficas para o mercado global”, segundo a agência catari Al Jazeera. “O aumento nos preços seria imprevisível. Seriam uns US$ 300 por barril, se não mais”, afirmou.

No setor de alimentação, alguns gigantes mundiais suspenderam suas operações na Rússia. Um deles é o McDonald’s, que fechará todos seus restaurantes. Ao final do ano passado, a rede tinha 847 lojas no país. Diferente do que ocorre no resto do mundo, onde habitualmente atua no sistema de franquias, 84% das lojas russas são operadas pela própria companhia. Somado ao faturamento na Ucrânia, a operação responde por 9% da receita global da empresa.

Seguindo o mesmo caminho da tradicional rede de lanchonetes, a Coca-Cola também confirmou que sairá da Rússia. “Nossos corações estão com as pessoas que estão resistindo a efeitos inconcebíveis desses trágicos eventos na Ucrânia”, disse a empresa em comunicado. A PepsiCo, por sua vez, deixará de vender bebidas na Rússia, mas manterá as linhas de produtos essenciais, como leite e comidas para bebês. O Starbucks, por sua vez, fechará as lojas e interromperá o fornecimento de produtos a parceiros.

Loja da rede Starbucks em Moscou (Foto: Flickr)

A indústria automobilística também começou a deixar a Rússia, puxada pelas decisões das japonesas Toyota e Nissan de suspenderem a produção em suas fábricas em São Petesburgo. Ambas também anunciaram que deixarão de exportar veículos ao país, decisão que foi acompanhada por outras gigantes do setor como Honda, Jaguar, Ferrari, GM e Volkswagen. Na área de aviação, a Boeing diz que não mais comprará titânio russo para usar na produção de aviões.

Outra decisão que tende a impactar na rotina dos russos é o fim dos serviços das companhias de cartões de crédito Mastercard e Visa. O maior banco estatal da Rússia, o Sberbank, disse que o impacto na rotina doméstica dos cidadãos será pequeno. A instituição financeira assegurou que ainda será possível “sacar dinheiro, fazer transferências usando o número do cartão e pagar em lojas russas offline e online”, de acordo com a rede britânica BBC.

A tendência é a de que os consumidores russos possam usar os cartões normalmente até que percam a validade, e depois disso não recebam novos plásticos. Entretanto, os cartões emitidos na Rússia deixarão de ser aceitos no exterior imediatamente. Isso já criou problemas, por exemplo, para turistas russas que ficaram impedidos de deixar a Tailândia, por problemas com voos e cartões.

No setor de vestuário, quem anunciou estar deixando o mercado russo é a Levi’s, sob o argumento de que quaisquer considerações comerciais “são claramente secundárias em relação ao sofrimento humano experimentado por tantos”. Nike e Adidas também suspenderam todas as operações no mercado russo. A sueca Ikea, gigante do setor de móveis, é outra que decidiu deixar a Rússia em função da guerra.

Nas áreas de entretenimento e tecnologia, alguns gigantes também optaram por suspender as vendas de produtos e serviços no país de Vladimir Putin. A Netflix interrompeu seus serviços e cancelou todos os projetos e aquisições na Rússia, enquanto Warner, Disney e Sony adiaram os lançamentos de suas novas produções no país. Já a Apple excluiu os aplicativos das empresas estatais russas de mídia RT e Sputnik e disse que não mais venderá seus produtos, como iPhones, iPads e afins, em território russo. Panasonic, Nokia, Microsoft e Samsung são outras que optaram por encerrar as operações no país.

iPhone, da Apple, que deixará de vender produtos na Rússia (Foto: Divulgação/Unsplash/Christian Allard)

Por que isso importa?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo ano e se estende até hoje.

O conflito armado no leste da Ucrânia opõe o governo central às forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que formam a região de Donbass e foram oficialmente reconhecidas como territórios independentes por Moscou. Foi o suporte aos separatistas que Putin usou como argumento para justificar a invasão, classificada por ele como uma “operação militar especial”.

“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro, de acordo com o site independente The Moscow Times. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país, segundo a agência AFP.

Desde o início da ofensiva, as forças da Rússia caminham para tentar dominar Kiev, que tem sido alvo de constantes bombardeios. O governo da Ucrânia e as nações ocidentais acusam Moscou de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, o que pode ser caracterizado como crime de guerra ou contra a humanidade.

Fora do campo de batalha, o cenário é desfavorável à Rússia, que tem sido alvo de todo tipo de sanções. Além das esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais, que já começaram a sufocar a economia russa, o país tem se tornado um pária global. Representantes russos têm sido proibidos de participar de grandes eventos em setores como esporte, cinema e música.

De acordo com o presidente dos EUA, Joe Biden, as punições tendem a aumentar o isolamento da Rússia no mundo. “Ele não tem ideia do que está por vir”, disse o líder norte-americano, referindo-se ao presidente russo Vladimir Putin. “Putin está agora mais isolado do mundo do que jamais esteve”.

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