Países bálticos planejam fortificações na fronteira para conter eventual ataque da Rússia

Objetivo de Estônia, Letônia e Lituânia é 'combater o inimigo desde o primeiro metro e na primeira hora' caso sejam agredidos

A Estônia, a Letônia e a Lituânia são vistos como os alvos mais prováveis da Rússia caso Vladimir Putin tente atacar países da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) na sequência da guerra da Ucrânia. Diante de tal ameaça, após uma reunião em janeiro, os ministros da Defesa dos três países bálticos concordaram em desenvolver uma ampla rede de fortificações para deter e combater qualquer incursão russa na região, segundo relatou a revista Newsweek.

Considerando os desafios geográficos, com uma fronteira de 340 quilômetros com a Rússia, em sua maioria composta por densas florestas e áreas alagadas, autoridades estonianas anunciaram planos ambiciosos para construir cerca de 600 abrigos. O projeto custará aproximadamente 60 milhões de euros e visa garantir a prontidão “para combater o inimigo desde o primeiro metro e na primeira hora.”

Forças aliadas estacionadas em Tapa, na Estônia (Foto: WikiCommons)

Susan Lilleväli, subsecretária de prontidão de defesa do Ministério da Defesa da Estônia, enfatizou a importância de investir em infraestrutura defensiva. Ela destacou que os recentes acontecimentos na Ucrânia deixaram claro o quão difícil e custoso pode ser recuperar territórios após uma invasão, tanto em termos humanos quanto em recursos.

“Além de equipamentos, munições e pessoal, é fundamental termos instalações físicas adequadas para garantir a defesa eficaz de nossos países”, ressaltou a subsecretária.

O processo de construção terá início na Estônia, onde o governo planeja cerca de 600 bunkers, concentrados nas áreas de passagem fronteiriça de Narva, ao norte, e Voru, ao sul.

“Essas instalações têm como principal objetivo evitar conflitos militares em nossa região, já que podem alterar o cálculo do inimigo”, disse Lilleväli. “Estratégias de contramobilidade e fortificação desempenharam um papel crucial nas guerras em nossa região ao longo da história, como foi o caso da Finlândia. E, como a recente guerra na Ucrânia demonstrou, essas medidas continuam sendo válidas.”

Caso Putin ataque os três países da Otan, os aliados do tratado de defesa seriam obrigados a entrar em ação militar contra o Estado russo, incluindo o Reino Unido e os EUA.

O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, já alertou a Europa para aumentar os níveis de produção de armas e munições para enfrentar a ameaça da Rússia. “Precisamos reconstituir e expandir nossa base industrial para aumentar as entregas para a Ucrânia e reabastecer os estoques”, disse ele.

A declaração de Stoltenberg indica que a aliança não está buscando ativamente uma guerra com a Rússia. No entanto, ao destacar a invasão à Ucrânia, ele sugere que eventos como esse mostram que “a paz na Europa não é algo garantido”.

Em outras palavras, Stoltenberg disse que a ação agressiva da Rússia na Ucrânia serve como um lembrete de que conflitos podem surgir e que a estabilidade na região exige vigilância e prontidão por parte da aliança ocidental e seus aliados.

“Se Putin vencer na Ucrânia, não há garantia de que a agressão russa não se espalhará ainda mais”, disse ele ao jornal Welt am Sonntag, da Alemanha. “Apoiar a Ucrânia agora e investir nas próprias capacidades da Otan é nossa melhor defesa.”

Como serão os abrigos

Autoridades estonianas já elaboraram planos para a construção de 600 abrigos, que serão abastecidos por estoques locais de equipamentos e munições. Segundo esboços compartilhados com a Newsweek, a maioria desses abrigos será em forma de “porões” de concreto cúbico, construídos no subsolo, com trincheiras de tiro parcialmente cobertas cruzando a entrada.

Protótipos estão em fase de construção, com previsão de início dos testes ainda neste ano. A Estônia planeja instalar os primeiros abrigos a partir do início de 2025.

“Basicamente, são como porões construídos no subsolo”, explicou o tenente-coronel da reserva Kaido Tiitus, conselheiro de Lilleväli. Cada abrigo terá cerca de 35 metros quadrados e será projetado para abrigar até dez soldados, além de todo o equipamento necessário. Eles serão concebidos para que os soldados possam permanecer “morando” neles por períodos prolongados e para oferecer proteção contra os projéteis de artilharia inimiga, acrescentou Tiitus.

Os abrigos serão agrupados em “fortalezas”, compostas por vários abrigos menores. Em caso de guerra, dispositivos explosivos, obstáculos e sensores eletrônicos podem ser utilizados para apoiar as operações defensivas. “Estamos nos preparando com todos os meios necessários para o combate”, enfatizou Tiitus.

Em entrevista concedida na semana passada a Tucker Carlson, conhecido apresentador conservador dos EUA, Putin afirmou que Moscou não tem intenção de atacar países na fronteira oriental da Otan, descartando o que alguns líderes ocidentais vêm alertando.

“Não estamos interessados na Polônia, Letônia ou em qualquer outro lugar”, declarou Putin. “Isso é apenas alarmismo desnecessário”.

Trunfo báltico

As nações bálticas estavam em alerta desde antes da agressão à Ucrânia, pois representam a principal linha de resistência ocidental no entorno de Moscou. Elas têm se posicionado entre os mais importantes apoiadores de Kiev durante o conflito, com apoio militar e ações duras contra Moscou.

A Lituânia aprovou, em maio de 2022, uma resolução que declara a Rússia um “Estado terrorista” e classifica as ações de Moscou na Ucrânia como genocídio. A Letônia, por sua vez, fechou uma emissora russa no país e prendeu um ex-ministro local por acusações de espionagem pró-Kremlin. Já a Estônia tem sido bastante vocal em favor da adesão da Ucrânia à Otan.

O fato de fazerem parte da aliança militar transatlântica é o principal trunfo dos bálticos. Isso graças ao artigo 5º do estatuto da Otan, segundo o qual os países-membros “concordam que um ataque armado contra um ou mais deles na Europa ou na América do Norte deve ser considerado um ataque contra todos eles.” Isso tornaria uma eventual agressão russa um ataque contra os EUA e seus aliados.

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