Sob pressão, grupo que combate a tortura na Rússia encerra as atividades

Comitê Contra a Tortura colocou fim às operações após ser rotulado pelo governo pela terceira vez como "agente estrangeiro"

O Comitê Contra a Tortura (KPP, na sigla em russo), proeminente grupo humanitário da Rússia, anunciou na segunda-feira (13) o fim de suas operações, depois de ser rotulado pelo governo pela terceira vez como “agente estrangeiro”. As informações são da rede Radio Free Europe.

“Não queremos continuar trabalhando sendo rotulados como agentes estrangeiros. Consideramos esse termo um insulto e uma calúnia”, afirmou Sergei Babinets, chefe do KPP, que se manifestou através do aplicativo de mensagens Telegram.

Entretanto, Babinets disse que o grupo seguirá ativo, embora não tenha informado como isso será feito. “Queremos viver em uma Rússia sem tortura e certamente tornaremos nosso país melhor. Esse é nosso dever”, disse ele, prometendo divulgar mais detalhes posteriormente.

Fundado no ano 2000, o KPP ganhou destaque por contestar a brutalidade policial. É especialmente atuante na Chechênia, onde Ramzan Kadyrov, líder local apontado pelo Kremlin, impôs um clima de medo contra oposicionistas e minorias, sob um manto de impunidade que encoraja os abusos das autoridades.

Agentes da polícia de Moscou interrompem protesto em dezembro de 2011 (Foto: CEA+/Flickr)

Quando foi rotulado pela primeira vez como “agente estrangeiro”, o grupo fechou as portas em vez de apenas pagar as multas impostas. Depois, foi reformulado, mudou de nome, manteve a sigla KPP e reabriu. Rotulado de novo um ano depois, passou a atuar como grupo voluntário em vez de organização registrada.

Desta vez, a situação é diferente porque a lei do “agente estrangeiro” passou a permitir que não apenas organizações sejam rotuladas, mas também os indivíduos que são parte dela. Desta forma, o grupo resolveu adotar uma medida extrema a fim de proteger seus colaboradores.

Mesmo assim, a assessora de imprensa do KPP diz que, apesar do fechamento oficial, seus funcionários continuam a trabalhar em cima dos 188 casos abertos. Entretanto, os advogados a serviço do grupo ficam proibidos de comparecer a audiências e de questionar as autoridades sobre as reclamações dos clientes.

Por que isso importa?

Organizações não governamentais, veículos de imprensa e os colaboradores de ambos têm sido alvo de uma dura repressão do governo Putin, com o respaldo da Justiça da Rússia. A perseguição se escora na “lei do agente estrangeiro”, que foi aprovada em 2012 e modificada diversas vezes, dando às autoridades o poder de acessar todas as informações privadas das instituições e indivíduos rotulados.

A designação “agente estrangeiro” carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. A classificação acaba por afastar potenciais parceiros comerciais e anunciantes, muitas vezes sufocando financeiramente as instituições listadas.

Órgãos e indivíduos nessa condição e que não atendam às exigências impostas pela lei podem pegar pena de até dois anos de prisão, de acordo com o código penal russo, e as organizações correm o risco de serem proibidas de funcionar. Tal sistema repressivo tem sido uma importante arma do Kremlin para calar os críticos, levando a ordens de prisão, casos de exílio forçado e ao fechamento de entidades.

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