Argélia diz que mediará solução para a crise na África após golpe de Estado no Níger

Processo de transição democrática de seis meses solucionaria o impasse e acalmaria a CEDEAO, que ameaça uma ação militar

O governo da Argélia anunciou na segunda-feira (2) que o Níger, palco de um golpe de Estado que derrubou o presidente Mohamed Bazoum em julho, aceitou a mediação argelina para resolver a crise política no país que ameaça se espalhar pela África. As informações são da rede France 24.

“O governo argelino recebeu, através do Ministério das Relações Exteriores do Níger, a aceitação de uma mediação argelina destinada a promover uma solução política para a crise”, afirmou a diplomacia da Argélia em comunicado.

O texto diz, ainda, que o ministro das Relações Exteriores argelino, Ahmed Attaf, foi encarregado de “visitar Niamey o mais rápido possível com o objetivo de iniciar discussões com todas as partes interessadas.”

Abdelmadjid Tebboune, presidente da Argélia, fevereiro de 2020 (Foto: Wikimedia Commons)

Conforme a proposta feita por Argel, seria iniciado um processo de transição que levaria seis meses e teria o objetivo de restabelecer “a ordem constitucional e democrática” no Níger, embora o general Abdourahamane Tiani, que assumiu o poder no golpe, fale em um prazo mais longo, de até três anos.

“Na nossa opinião, o processo pode ser concluído em seis meses para que o golpe não se torne fato consumado”, declarou Attaf, acrescentando que em nesse prazo seria possível “formular acordos políticos com a aceitação de todos os partidos no Níger, sem excluir nenhum partido.”

No mesmo comunicado em que anunciou a mediação, a Argélia disse que “a aceitação da iniciativa reforça a perspectiva de uma solução política para esta crise”, o que seria de interesse de toda a região. E explicou que o processo seria supervisionado por um “poder civil liderado por uma figura de consenso”, dando a entender que um novo chefe de Estado assumiria o lugar de Bazoum.

A intervenção argelina ajuda a amenizar o risco de um conflito armado na África decorrente do golpe. Sob a liderança de Nigéria e Chade, a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) tem se colocado desde o início contra o golpe e cogitou uma ação militar para restabelecer a democracia.

A CEDEAO argumenta que, se a tomada de poder no Níger for bem-sucedida, outras poderiam ocorrer na África, levando a uma sucessão de golpes que de certa forma já está em curso e se alastraria ainda mais. Prova de que a preocupação é procedente é o fato de o Gabão ter sofrido um golpe militar no final de setembro.

A ameaça de invasão levou MaliBurkina Faso, nações vizinhas ao Níger e igualmente governadas por juntas militares golpistas, a assinarem em setembro um pacto de defesa pelo qual se comprometem a agir em defesa de Niamey em caso de agressão externa.

A Argélia tenta manter papel de neutralidade e diz que rejeita a ideia de uma ação militar. O governo afirmou que não autorizaria a CEDEAO a usar o espaço aéreo argelino para atacar o Níger, embora não tenha manifestado qualquer intenção de aderira à tríplice aliança de defesa.

O presidente da Argélia, Abdelmadjid Tebboune, disse antes de iniciados os debates sobre a mediação que uma solução militar seria “uma ameaça direta” a seu país e que “não haverá solução sem nós (os argelinos). Somos as primeiras pessoas afetadas.”

Por que isso importa?

Em 26 de julho, o Níger foi palco de um golpe de Estado, no qual o general Abdourahamane Tchiani, alegando “deterioração da situação de segurança” no país devastado pela ação de grupos jihadistas, se autodeclarou líder nacional dois dias depois após destituir o presidente democraticamente eleito Mohamed Bazoum. 

A ascensão ao poder de Bazoum, eleito no final de fevereiro de 2021, marcou uma transferência pacífica de poder histórica no Níger desde sua independência da França em 1960. Ele agora encontra-se sob custódia da guarda presidencial no palácio da presidência e pode ser julgado sob a acusação de “alta traição”.

O político é reconhecido como um aliado fundamental nos esforços ocidentais para combater a insurgência islâmica na região do Sahel, e Niamei é um dos principais beneficiários da ajuda externa.

Apesar dos apelos de diversos países e blocos regionais, clamando pela reinstauração do presidente deposto, Tchiani rejeitou tais chamados, argumentando que configuram “interferência nos assuntos internos do país”.

Um dos países mais pobres do mundo, conforme classificação da ONU (Organização das Nações Unidas), o Níger luta contra o alastramento do Boko Haram, ligado à Al-Qaeda, e do ISWAP (Estado Islâmico da África Ocidental), ambos da Nigéria, que já expandiram sua atuação para a nação vizinha.

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