Explosão de mina terrestre deixa oito soldados de paz da ONU feridos no Mali

As vítimas são militares de Burkina Faso, e o local onde ocorreu o incidente tem forte presença de grupos jihadistas

Oito soldados de paz da Minusma (Missão de Estabilização da ONU no Mali) ficaram feridos na explosão de uma mina terrestre na região de Timbutku, no Mali, na quinta-feira (23). As informações são do site The Defense Post.

Olivier Salgado, porta-voz da Minusma, confirmou o incidente em sua conta no Twitter. “Uma patrulha de segurança das forças de paz atingiu uma mina/dispositivo explosivo por volta das 13h (horário local) de hoje perto de Ber (região de Timbutku). Oito forças de paz foram feridos e acabaram de ser evacuadas. Desejamos a eles uma rápida e total recuperação”.

As vítimas são militares de Burkina Faso, e o local onde ocorreu o incidente tem forte presença de grupos jihadistas. Somente neste mês, quatro integrantes das forças de paz da ONU foram mortos no Mali em possíveis ataques extremistas.

Ao comentar o episódio mais recente, de um soldado guineense morto no norte do país, o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, destacou que ataques contra forças de paz da ONU podem constituir crimes de guerra. E pediu às autoridades malianas que “não poupem esforços” na identificação dos perpetradores, para que possam ser rapidamente levados à Justiça.

Recorde de mortes

A ONU anunciou na quarta-feira (22), durante seu Memorial Anual, que em 2021 foi registrado o maior número de mortes de servidores no período de um ano em toda a história da entidade. No total, 485 funcionários morreram no ano passado, sendo 414 civis. Eles eram de 104 países diferentes.

Segundo a ONU, desde sua fundação, mais de 3,5 mil homens e mulheres perderam a vida enquanto serviam à entidade. Ole Bakke, norueguês servindo na Palestina, foi a primeira vítima da história da ONU, morto a tiros em julho de 1948.

Membros da operação de paz da ONU atuam durante a crise política no Mali (Foto: Minusma/Gema Cortes)
Por que isso importa?

O Mali vive um período de instabilidade política que começou com o golpe de Estado em 2012, que permitiu a vários grupos rebeldes e extremistas tomar o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.

A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos salários dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.

Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem o militar na formação do novo governo.

Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população malinesa rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.

Militarmente, especialistas e políticos ocidentais enxergam uma geopolítica delicada no país, devido ao aumento constante da influência de grupos jihadistas ligados à Al-Qaeda e ao Estado Islâmico (EI) e à consequente explosão da violência nos confrontos entre extremistas e militares. Além disso, trata-se de uma posição importante para traficantes de armas e pessoas, e o processo em curso de redução das tropas franceses, que atuam no país desde 2013, tende a piorar a situação.

Os conflitos, antes concentrados no norte do país, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. A região central do Mali se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra forças do governo.

Colabora para piorar a situação a ruptura entre o governo maliano e seu principal parceiro ocidental para gestão da segurança, a França. Desde o ano passado, as forças armadas francesas iniciaram um processo de retirada de tropas, o que gerou dúvidas quanto à capacidade de o Mali sustentar os avanços na luta contra o jihadismo.

Uma das razões para a retirada francesa foi o acordo com os mercenários do Wagner Group firmado pelo coronel Assimi Goita, que assumiu o poder no golpe de Estado de maio de 2021. Paris e as demais nações ocidentais contestam a parceria e acusam a organização russa, supostamente ligada ao Kremlin, de cometer crimes de guerra em conflitos nos quais esteve envolvida em todo o mundo.

Fontes sustentam que o pagamento pelos serviços da organização seria de US$ 10,8 milhões por mês, dinheiro que vem da extração de minerais, acreditam especialistas. O governo do Mali, entretanto, alega que os russos são apenas instrutores e “não estão em funções de combate”.

Tags: