Autoridades dos EUA prenderam nos últimos dias oito migrantes do Tadjiquistão acusados de ligação com o Estado Islâmico (EI). As detenções ocorreram em operações paralelas realizadas em três cidades norte-americanas, Nova York, Los Angeles e Filadélfia, segundo relatou a agência Associated Press (AP).
Os suspeitos haviam conseguido entrar nos EUA nos últimos meses porque no momento da imigração não havia qualquer informação que os ligasse à organização terrorista. Desde então, porém, vinham sendo monitorados pelo FBI, a polícia federal norte-americana.
Os oito indivíduos foram presos sob a acusação de desrespeitar as leis de imigração locais e agora enfrentam um processo de expulsão do país, com destino não divulgado pelas autoridades. Também não foi informado o tipo de relação que mantinham com o EI.
As detenções ocorrem dias depois de duas autoridades governamentais norte-americana alertarem para o risco ampliado de ataques terroristas no país.
O procurador-geral Merrick Garland afirmou, em audiência perante o Comitê Judiciário da Câmara dos EUA, que o nível de ameaça no país cresceu “enormemente”. Já o diretor do FBI, Christopher Wray, falou a uma comissão do Senado que desde o ataque do Hamas a Israel, no dia 7 de outubro de 2023, diversos grupos extremistas têm incentivado “ataques contra os americanos e os nossos aliados.”

Cidadãos do Tadjiquistão têm recebido atenção especial das autoridades ocidentais desde março deste ano, quando quatro tadjiques realizaram um ataque terrorista que matou mais de 140 pessoas na casa de espetáculos Crocus City Hall, em Moscou, na Rússia. A ação foi reivindicada pelo Estado Islâmico-Khorasan (EI-K), do Afeganistão.
Em artigo para a revista Foreign Affairs, publicado em maio, a historiadora francesa Marlene Laruelle afirmou que “fatores socioeconômicos e políticos se combinaram para tornar os jovens tadjiques singularmente suscetíveis à radicalização.”
O EI-K, por sua vez, vem crescendo nos últimos anos e cada vez mais se torna uma ameaça global. Na semana passada, a facção indicou que a Copa do Mundo T20, evento esportivo de críquete sediado nos EUA e em seis países caribenho, poderia ser alvo de ataques. Uma imagem publicada em seus canais de propaganda sugere que o grupo extremista planejava atingir o evento.
O EI-K usou suas redes para difundir uma montagem que mostra drones sobre o Estádio Internacional de Críquete de Nassau, dentro do Parque Eisenhower, em Nova York, com um terrorista e uma bomba também retratados. “Você espera pelos jogos. Nós esperamos por você”, diz o pôster, que foi republicado por perfis diversos na rede social X, antigo Twitter.
Entretanto, as autoridades dos EUA não deixaram claro se os cidadãos tadjiques detidos nos últimos dias estavam ligados à facção afegã ou ao ramo principal da organização terrorista.
Por que isso importa?
O EI passa por um processo de enfraquecimento que começou com a derrota da organização em seus dois principais redutos. No Iraque, o exército iraquiano retomou todos os territórios que o grupo dominava desde 2014. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela facão extremista na Síria.
De acordo com relatório divulgado em agosto de 2023 pela ONU (Organização das Nações Unidas), o EI “continua a comandar entre cinco mil e sete mil membros em todo o Iraque e na República Árabe da Síria, a maioria dos quais combatentes.” No entanto, “adotou deliberadamente uma estratégia para reduzir os ataques, a fim de facilitar o recrutamento e a reorganização.”
Atualmente, a maioria dos líderes do EI permanece no noroeste da Síria, mas “o grupo realocou algumas figuras-chave para outros lugares.” Um continente de forte presença da organização é a África, com afiliados locais representando uma ameaça constante aos governos da região.
Um desses afiliados é o Estado Islâmico no Grande Saara (EIGS), que ampliou sua área de atuação, com aumento de ataques no Mali e, em menor escala, em Burkina Faso e no Níger. Recentemente, tem feito esforços para estabelecer “um corredor para a Nigéria para fins logísticos, de abastecimento e recrutamento, possivelmente em colaboração com o ISWAP” (Estado Islâmico da África Ocidental).
A avaliação da equipe de monitoramento da ONU, entregue ao Conselho de Segurança no final de julho, surge em meio a mais um momento crucial da luta contra o terrorismo. Desde fevereiro de 2022, o EI sofreu diversos duros golpes, com três líderes da organização mortos em operações de combate ao terrorismo.
O mais recente deles foi Abu al-Hussein al-Husseini al-Qurashi, morto em abril. O governo turco reivindicou a ação, embora a própria organização terrorista alegue que o comandante morreu em confronto com o Hayat Tahrir Al-Sham (HTS), uma organização extremista associada à Al-Qaeda e listada pelo governo norte-americano como terrorista.
“Apesar do progresso feito no direcionamento de suas operações financeiras e quadros de liderança, a ameaça representada pelo Daesh (sigla árabe para se referir ao grupo) e suas afiliadas regionais permaneceu alta e dinâmica nas amplas áreas geográficas onde está presente”, diz a ONU, citando a África como uma região de particular preocupação.
Terrorismo no Brasil
Episódios recentes mostram que o Brasil é visto como porto seguro pelos extremistas e é, também, um possível alvo de ataques. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al-Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao EI foram presos e dois fugiram.
Mais tarde, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles foram acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
A ameaça voltou a ser evidenciada com a prisão, em outubro de 2023, de três indivíduos supostamente ligados ao Hezbollah que operavam no Brasil. Eles atuavam com a divulgação de propaganda do grupo extremista e planejavam atentados contra entidades judaicas.
Para o tenente-coronel do exército brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), tais episódios causam “preocupação enorme”, vez que confirmam a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras).
A opinião é compartilhada por Barbara Krysttal, gestora de políticas públicas e analista de inteligência antiterrorismo.
“O Brasil recorrentemente, nos últimos dez, cinco anos, tem tido um aumento significativo de grupos terroristas assediando jovens e cooptando adultos jovens para fazer parte de ações terroristas no mundo todo”, disse ela, que também vê o país sob ameaça de atentados. “Sim, é um polo que tem possibilidade de ser alvo de ações terroristas.”