‘Entre a democracia e o autoritarismo, estaremos do lado da democracia’, diz novo presidente de Taiwan

Contrário à reunificação com a China, Lai Ching-te já foi primeiro-ministro e é o atual vice-presidente da ilha

Lai Ching-te, novo presidente de Taiwan, prometeu trabalhar para que a ilha mantenha a independência em relação à China e fortaleça as parcerias com democracias. O político, que é vice-presidente desde 2020, saiu vitorioso da eleição no último sábado (13) e já deixou claro que não aceita as reivindicações de Beijing sobre o território semiautônomo. As informações são da agência Associated Press.

Aos 64 anos, Lai, após vencer Hou Yu-ih do partido Kuomintang (KMT), e Ko Wen-je, do Partido Popular de Taiwan (TPP), afirmou que Taiwan permanecerá “ao lado das democracias globais”. Ele destacou a escolha de “apoiar a democracia em detrimento do autoritarismo” em sua mensagem para os 23 milhões de habitantes da ilha.

Lai Ching-te, o presidente eleito de Taiwan, em foto de 2022 (Foto: WikiCommons)

O novo líder, que também é vice-presidente do Partido Democrático Progressista (DPP, da sigla em inglês), prometeu fortalecer a defesa e a economia de Taiwan, que tem uma dependência significativa do comércio com a China.

Ele amenizou sua posição em relação à independência e expressou o desejo de retomar o diálogo com o governo chinês, que tem evitado comunicações com os líderes da ilha de uns anos para cá. Disse que buscará a paz para ambas as partes.

“A paz é inestimável, e a guerra não tem vencedores”, disse.

As chances de sucesso de Lai nas negociações com a China, no entanto, são praticamente nulas, apostam analistas. Beijing criticou repetidamente tanto o DPP quanto Lai, o que sinaliza uma falta de perspectiva de melhoria nas relações.

Em vez de diálogo, a China provavelmente adotará uma abordagem de “campanha de pressão máxima“, incluindo coerção militar e econômica, observou Wen-Ti Sung, membro do think tank Atlantic Council, com sede nos EUA.

Wen acrescentou que Beijing geralmente só adota essa postura quando percebe uma baixa probabilidade de reconciliação entre os dois lados.

“Separatista perigoso”

Lai faz parte de uma ala mais radical do Partido Democrático Progressista, que é a favor de Taiwan ser independente. Ele já foi primeiro-ministro taiwanês, de 2017 a 2019, e depois aceitou ser o vice da Tsai Ing-wen em 2020, quando assumiu o cargo em maio.

O partido dele é contra juntar Taiwan com a China, por isso, o presidente eleito está no radar de Xi Jinping.

Antes das eleições, Beijing não poupou críticas a Lai, chamando-o de “separatista perigoso” e ignorando os pedidos dele por diálogo. Na sexta-feira (12), um dia antes da eleição, o Ministério de Defesa chinês disse que o Exército está atento ao novo governo e pronto para “esmagar” qualquer plano de independência de Taiwan.

Apoio dos EUA

Em uma reunião nesta segunda-feira (15), Lai manifestou a esperança de que Washington continue apoiando Taiwan, durante visita de uma delegação de ex-altos funcionários dos EUA à ilha. O encontro teve como objetivo discutir questões bilaterais entre as duas partes, segundo a rede Radio Free Europe.

O Instituto Americano em Taiwan (AIT, da sigla em inglês), a representação diplomática dos EUA na ilha, informou em comunicado no domingo (14) que uma delegação de ex-altos funcionários, incluindo Stephen Hadley e James Steinberg, estaria em Taipé para se encontrar com “líderes políticos”.

A comitiva também parabenizou a presidente Tsai Ing-wen pela eleição, destacando que a democracia de Taiwan “serve como exemplo para o mundo”, segundo Hadley, acrescentando que espera pela “continuidade da relação entre Taiwan e os Estados Unidos sob a nova administração e pelos esforços comuns para preservar a paz e a estabilidade através do Estreito.”

Os principais aliados estratégicos de Taiwan parabenizaram a vitória nas eleições. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, elogiou a ilha pelo seu “sólido sistema democrático e processo eleitoral”, enquanto o Japão elogiou a “execução perfeita” das eleições democráticas.

Por outro lado, Beijing afirmou que o DPP “não reflete a opinião pública majoritária”, apontando para o fato de Lai ter conquistado apenas 40% dos votos e o DPP não ter mantido a maioria no Legislativo. Além disso, acrescentou que esse resultado não impediria a “inevitável tendência de reunificação da China”.

Por que isso importa?

Taiwan é uma questão territorial sensível para a China, e a queda de braço entre Beijing e o Ocidente por conta da pretensa autonomia da ilha gera um ambiente tenso, com a ameaça crescente de uma invasão pelas forças armadas chinesas a fim de anexar formalmente o território taiwanês.

Nações estrangeiras que tratem a ilha como nação autônoma estão, no entendimento de Beijing, em desacordo com o princípio “Uma Só China“, que também vê Hong Kong como parte da nação chinesa.

Embora não tenha relações diplomáticas formais com Taiwan, assim como a maioria dos demais países, os EUA são o mais importante financiador internacional e principal parceiro militar de Taipé. Tais circunstâncias levaram as relações entre Beijing e Washington a seu pior momento desde 1979, quando os dois países reataram os laços diplomáticos.

A China, em resposta à aproximação entre o rival e a ilha, endureceu a retórica e tem adotado uma postura belicista na tentativa de controlar a situação. Jatos militares chineses passaram a realizar exercícios militares nas regiões limítrofes com Taiwan e habitualmente invadem o espaço aéreo taiwanês, deixando claro que Beijing não aceitará a independência formal do território “sem uma guerra“.

A crise ganhou contornos mais dramáticos após a visita da presidente da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, à ilha em 2022. Foi a primeira pessoa ocupante do cargo a viajar para Taiwan em 25 anos, atitude que mexeu com os brio de Beijing. Em resposta, o exército da China realizou um de seus maiores exercícios militares no entorno da ilha, com tiros reais e testes de mísseis em seis áreas diferentes.

O treinamento serviu como um bloqueio eficaz, impedindo tanto o transporte marítimo quanto a aviação no entorno da ilha. Assim, voos comerciais tiveram que ser cancelados, e embarcações foram impedidas de navegar por conta da presença militar chinesa.

Desde então, aumentou consideravelmente a expectativa global por uma invasão chinesa. Para alguns especialistas, caso do secretário de Defesa dos EUA Lloyd Austin, o ataque “não é iminente“. Entretanto, o secretário de Estado Antony Blinken afirmou em outubro “que Beijing está determinada a buscar a reunificação em um cronograma muito mais rápido”.

As declarações do chefe da diplomacia norte-americana vão ao encontro do que disse o presidente chinês Xi Jinping no 20º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC). “Continuaremos a lutar pela reunificação pacífica”, disse ele ao assegurar seu terceiro mandato à frente do país. “Mas nunca prometeremos renunciar ao uso da força. E nos reservamos a opção de tomar todas as medidas necessárias”.

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