O presidente palestino Mahmoud Abbas se manifestou publicamente a favor da China no que tange aos abusos cometidos contra os uigures e outras minorias muçulmanas na região de Xinjiang. Ele assinou uma declaração conjunta com o líder chinês Xi Jinping durante visita a Beijing nesta semana, segundo informa a rede Radio Free Asia (RFA).
“Questões ligadas a Xinjiang não são questões de direitos humanos, mas sim de terrorismo antiviolento, desradicalização e antisseparatismo”, diz o documento. “A Palestina se opõe firmemente à interferência nos assuntos internos da China sob o pretexto de questões relacionadas a Xinjiang.”
A declaração cita ainda o conceito “Uma só China”, que trata Taiwan e Hong Kong como parte da China, e diz que o regime de Xi é o “único governo legal que representa toda a China”.
A visita de Abbas visa a fortalecer o papel da China como pretensa mediadora de um futuro acordo entre Israel e os palestinos que vivem em territórios ocupados, onde são vítimas de inúmeras restrições impostas pelo governo israelense.

Erkin Ekrem, professor associado de política externa da China na Universidade Hacettepe, na Turquia, diz que a posição de Abbas, embora passe por cima dos interesses muçulmanos, é uma forma de conquistar o apoio chinês em outros assuntos de interesse da Palestina.
“Os benefícios que eles podem obter da China superam os ganhos de apoiar os uigures”, disse o analista. “Nesse tipo de situação, a questão dos uigures, apesar de os uigures serem muçulmanos, não é uma prioridade para eles.”
Abbas não é o único líder palestino a agir dessa maneira. A Indonésia, que tem a maior população muçulmana do mundo, é uma nação que segue a mesma linha. “A notícia da mídia ocidental de que o governo chinês não permite que os muçulmanos façam atividades religiosas não é verdadeira”, disse em maio Ben Perkasa Drajat, cônsul-geral indonésio em Guangzhou, durante visita a Xinjiang.
Paquistão e Turquia, igualmente muçulmanos, também enviaram representantes à mesma viagem feita por Drajat, que teve inclusive representantes da diplomacia do Brasil. Na ocasião, Ma Xingrui, secretário do Partido Comunista Chinês (PCC) em Xinjiang, teria aproveitado o encontro para convocar as nações ali representadas a levantarem “suas vozes justas” contra as acusações de abusos na região.
Por que isso importa?
A província de Xinjiang, que fica no noroeste da China, faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.
Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.
Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.
O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.
A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século”.