Mais de 500 mil pessoas foram encarceradas em Xinjiang entre 2017 e 2021, diz ONG

Estudo só considera processos judiciais legítimos, mas muitas condenações "se somam aos crimes contra a humanidade"

A Justiça da China julgou e condenou mais de meio milhão de pessoas à prisão na região de Xinjiang entre 2017 e 2021. É o que aponta um estudo divulgado nesta quinta-feira pela (15) ONG Human Rights Watch (HRW), segundo a qual esse número “é muito maior do que geralmente relatado com base em números oficiais anteriores”.

O estudo leva em conta somente processos judiciais convencionais e desconsidera os casos de pessoas arbitrariamente detidas nos campos de reeducação mantidos pelo governo chinês. Para a entidade, no entanto, os julgamentos não bastam para legitimar as prisões.

“O governo chinês pode ter esperado que processar formalmente as pessoas em Xinjiang evitaria os holofotes de detenções em massa em campos de educação política extralegais”, disse Maya Wang, pesquisadora sênior da China na HRW. “Mas muitas dessas condenações apenas se somam aos crimes contra a humanidade de prisão injusta contra uigures e outros povos turcos”.

O relatório aponta que as condenações foram diminuindo ano a após ano, no mesmo ritmo em que a comunidade internacional aumentou a pressão sobre Beijing contra os abusos dos quais são vítima a comunidade uigur que habita Xinjiang. Foram 215.823 condenações em 2017; 135.546 em 2018; 96.596 em 2019; 48.258 em 2020; 44.603 em 2021. Um total de 540.826 casos ao longo de cinco anos.

Vista aérea de Urumqi, capital da província de Xinjiang, em julho de 2017 (Foto: WikiCommons/Anagoria)

“Embora os números de 2020 e 2021 tenham caído desde então, eles permanecem elevados e são comparáveis ​​aos números do início da Campanha Strike Hard, sugerindo que ela continua”, diz o texto, citando a campanha do presidente Xi Jinping para combater o extremismo religioso na região. Ou, como classifica a HRW, destruir “qualquer senso de identidade não-han-chinês”.

Não há dados sobre quantos desses condenados continuam encarcerados. Mas a ONG afirma que houve um aumento considerável nos casos de sentenças longas. “Antes de 2017, cerca de 10,8% das pessoas condenadas receberam penas de prisão superiores a cinco anos. Em 2017, eles compuseram 87% das sentenças”, diz o relatório, que não tem números dos anos seguintes.

Por que isso importa?

A província de Xinjiang, que fica no noroeste da China, faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.

Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Em agosto, a ONU (Organização das Nações Unidas) divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.

O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.

A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século”.

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