Presa pelas autoridades de Hong Kong desde setembro, a ativista pró-democracia e defensora dos direitos humanos Chow Hang-Tung ganhou a atenção da ONU (Organização das Nações Unidas), que na terça-feira (12) manifestou “profunda preocupação” com o caso dela e listou uma série de irregularidades cometidas pelo governo da China no processo de detenção.
A advogada, presa em 8 de setembro, era membro da Hong Kong Alliance, grupo que organiza uma vigília para relembrar os protestos na Praça das Paz Celestial, em Beijing, ocorridos em 1989 e reprimidos com enorme violência pelas autoridades chinesas. Vários outros ativistas da organização foram igualmente presos e acusados com base na lei de segurança nacional de Hong Kong.
“As acusações de terrorismo e sedição estão sendo usadas indevidamente para sufocar o exercício dos direitos fundamentais, que são protegidos pelo direito internacional, incluindo a liberdade de expressão e opinião, liberdade de reunião pacífica e o direito de participar de assuntos públicos”, diz o relatório produzido por um grupo de especialistas designados pela ONU.
Os especialistas em direitos humanos manifestam preocupação com a normativa, destacando sua incompatibilidade fundamental com o direito internacional e com as obrigações de direitos humanos. Também contestam a expressão “agente estrangeiro”, rótulo depreciativo atribuído a entidades que recebem financiamento proveniente do exterior.
Os relatores instam a China a assegurar o direito de as associações buscarem, receberem e usarem financiamento de fontes estrangeiras ou internacionais, sem impedimentos indevidos. “Tais medidas regulatórias, ao imporem restrições indevidas ao financiamento e punirem os destinatários de recursos externos, infringem o direito à liberdade de associação e também outros direitos humanos”, diz o documento.
Terrorismo e subversão
Na visão do grupo, o mau uso de acusações de terrorismo e subversão da segurança nacional, como habitualmente ocorre em Hong Kong por parte de Beijing, causa prejuízo global. “Esses rótulos não devem ser aplicados a crimes que não atendem aos limites previstos nas normas internacionais existentes”, diz o relatório, pois “prejudica a integridade das normas jurídicas, enfraquecendo as normas vinculativas do direito internacional tanto em casos de direitos humanos quanto de paz e segurança internacionais”.
Quando os governos usam indevidamente tais acusações para reprimir a oposição doméstica, limitar protestos e coibir críticas da sociedade civil e dos defensores dos direitos humanos, contribuem para reduzir a gravidade de atos terroristas e crimes de sedição em todo o mundo, algo “profundamente preocupante”.
Por que isso importa?
Após a transferência de Hong Kong do domínio britânico para o chinês, em 1997, o território passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Ainda assim, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa a favor da independência, em 2019.
A resposta de Beijing aos protestos veio através da lei de segurança nacional, que deu ao governo poder de reprimir a oposição. A normativa legal classifica e criminaliza qualquer tentativa de “intervir” nos assuntos locais como “subversão, secessão, terrorismo e conluio”. Infrações graves podem levar à prisão perpétua.
No final de julho de 2021, quase um ano após a implementação da legislação, foi anunciado o primeiro veredito de uma ação judicial baseada na nova normativa. Tong Ying-kit, um garçom de 24 anos, foi condenado a nove anos de prisão sob as acusações de praticar terrorismo e incitar a secessão.
O incidente que levou à condenação ocorreu em 1º de julho de 2020, o primeiro dia em que a lei vigorou. Tong dirigia uma motocicleta com uma bandeira preta na qual se lia “Liberte Hong Kong. Revolução dos Nossos Tempos”, slogan usado pelos ativistas antigoverno nas manifestações de 2019.