Volkswagen é acusada de usar trabalho forçado e de apoiar vigilância estatal em Xinjiang

Estudo mostra que a gigante automobilística alemã participou de um programa de Beijing de recrutamento de uigures

O antropólogo alemão Adrian Zenz, especializado na região chinesa de Xinjiang e no Tibete, apresentou na quarta-feira (14) indícios de que a gigante automobilística Volkswagen, da Alemanha, usou trabalho forçado dos uigures e contribuiu para a vigilância estatal contra a minoria étnica. Informações foram compartilhadas por ele na rede social X, antigo Twitter, e reproduzidas pela rede Radio Free Asia (RFA).

“Novas evidências implicam diretamente a Volkswagen em trabalho forçado”, disse Zenz em um post no X. “A pista de testes SAIC-VW em Turpan foi construída usando ‘trabalhadores uigures’ transferidos em uniformes militares. O projeto da VW os submeteu a doutrinação, recolha de dados biométricos, assimilação e vigilância.”

Panorama de Urumqi, capital de Xinjiang: abusos dos direitos humanos (Foto: Wikimedia Commons)

Segundo o antropólogo, a empresa alemã, através de uma afiliada local, aderiu ao programa estatal chinês de “alívio de pobreza” e assim obteve mão de obra uigur para o projeto. Os trabalhadores teriam sido transferidos para a região entre 2017 e 2018, pico das internações de uigures em campos de reeducação mantidos pelo governo da China.

A China Railway Engineering Corporation (CREC), uma holding estatal, chegou a divulgar fotos desses trabalhadores através de veículos de mídia chineses. As imagens mostram os uigures em uniformes militares com flores vermelhas, que segundo Zenz são “uma característica típica das transferências de trabalho mais coercitivas.”

O pesquisador explica que o treinamento militar é uma tática empregada por Beijing para disciplinar os uigures, parte de um processo mais amplo de reeducação para eliminar a cultura local. Ele conclui que a Volkswagen submeteu “seu próprio pessoal a trabalho forçado, assimilação, vigilância e doutrinação.”

A denúncia levou a uma manifestação da companhia, que disse estar analisando suas operações em Xinjiang, segundo a agência Reuters.

“A Volkswagen está atualmente em negociações com a joint venture não controlada SAIC-Volkswagen sobre a direção futura das atividades comerciais na província de Xinjiang. Diferentes cenários estão sendo considerados intensamente”, disse um porta-voz.

Por que isso importa?

A província de Xinjiang faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.

Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.

O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.

A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século”.

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