Depois dos EUA, Reino Unido aperta o cerco contra centros secretos de polícia da China

Governo promete investigar e punir eventuais casos de intimidação em seu território contra cidadãos britânicos ou estrangeiros

Na última segunda-feira (17), a Justiça dos EUA anunciou a prisão de dois indivíduos acusados de ligação com um centro secreto de polícia mantido pelo governo da China em Nova York. Agora é o Reino Unido que aperta o cerco contra Beijing, com a promessa de investigar e punir eventuais casos de intimidação em seu território contra cidadãos britânicos ou estrangeiros. As informações são da rede Reuters.

A existência dos “centros de serviço da polícia no exterior” foi revelada em um relatório publicado em setembro de 2022 pela ONG de direitos humanos Safeguard Defenders. Mais de cem dessas estações chegaram a funcionar em todo o mundo, com o objetivo de assediar cidadãos chineses no exterior.

Desde então, diversos países passaram a investigar a prática e a fechar os estabelecimentos, mas inúmeros seguem ativos. Um desses centros secretos de polícia a serviço do governo chinês opera em Londres, de acordo com a ONG, o que torna os cidadãos chineses por lá um alvo em potencial.

“Este governo leva a interferência com estrangeiros aqui, a intimidação transnacional, extremamente a sério. É completamente inaceitável e faremos o que for necessário para impedir que isso aconteça”, disse Chris Philp, ministro de Crime, Policiamento e Bombeiros.

Vista da capital britânica, Londres: influência chinesa na mira (Foto: Dominika Gregusova Pexels)

Embora não tenham sido relatados casos de assédio contra chineses em Londres, o centro secreto de polícia foi associado a um episódio delicado. Um empresário chinês que teria relação com a estação de serviço realizou um jantar para arrecadar dinheiro para o Partido Conservador, possivelmente como forma de aumentar a influência de Beijing na política britânica.

Na ocasião em que foi revelada a realização do jantar, o Partido Conservador disse que o homem foi expulso da associação local de membros e que o caso foi reportado às autoridades responsáveis. Mas esse não foi o único caso em que políticos britânicos se colocaram ao alcance da inteligência chinesa.

No início de 2022, o MI5, serviço de inteligência doméstica do Reino Unido, revelou a ação de uma suposta agente chinesa que estaria realizando “atividades de interferência política” no Parlamento. Ching Kui Lee, uma advogada baseada em Londres, teria “estabelecido ligações” para o Partido Comunista Chinês (PCC) com parlamentares em serviço e aspirantes.

A mulher teria feito doações a políticos na casa dos US$ 275 mil, entre eles o deputado trabalhista Barry Gardiner, além de ter distribuído centenas de milhares de dólares a integrantes do partido.

Diante desse cenário, Philp, ele próprio um parlamentar, lançou um alerta. “Todos os partidos políticos precisam estar alertas para o perigo de representantes de Estados hostis tentarem se infiltrar ou influenciar nossas atividades”, afirmou o ministro.

Rastreamento e perseguição

Segundo a Safeguard Defendersestações como as de Nova York e Londres surgiram como associações comunitárias de cidadãos de uma mesma região chinesa, como o objetivo de fornecer apoio administrativo a turistas e imigrantes, por exemplo na confecção de documentos. Com o tempo, porém, passaram a ser usados para reprimir dissidentes e cidadãos chineses acusados de crimes em seu país.

Na maioria dos casos, os locais operam um sistema online que coloca o cidadão chinês em contato com as autoridades na China. Os indivíduos são muitas vezes convencidos, sob pressão, a retornar ao território chinês para enfrentar a justiça local. Há indícios de envolvimento ativo das estações no rastreamento e na perseguição dos alvos em países estrangeiros.

Chineses repatriados

Dados da Safeguard Defenders apontam que, entre abril de 2021 e julho de 2022, 230 mil chineses “foram devolvidos para enfrentar possíveis acusações criminais na China” com ajuda dos centros de polícia. Os métodos adotados “geralmente incluem ameaças e assédio contra membros da família em casa ou diretamente contra o alvo no exterior, seja por meio online ou físico”. Para todos os efeitos, o governo chinês alega que os repatriados são acusados de algum crime.

Com a ajuda desses centros, Beijing impõe vigilância estatal e persegue inclusive grupos étnicos, com destaque para tibetanos e a minoria muçulmana uigur, bem como suas famílias.

Dois “centros de serviço” chineses operam o Brasil, sendo um em São Paulo e o outro no Rio de Janeiro. Entretanto, a Safeguard Defenders afirma que não há registro de assédio contra chineses nessas estações, que aparentemente vêm sendo usadas somente para dar apoio administrativo a turistas e imigrantes.

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