Justiça dos EUA sentencia a 15 anos de prisão homem acusado de financiar terrorista

O uzbeque Dilkhayot Kasimov teria dado dinheiro para um simpatizante do Estado Islâmico viajar até a Síria e se unir ao grupo

Uma corte federal dos EUA anunciou na última sexta-feira (3) a sentença do cidadão uzbeque Dilkhayot Kasimov, que em setembro de 2019 havia sido condenado por financiar o terrorismo. Ele terá que cumprir uma pena de 15 anos de prisão, de acordo com comunicado do Departamento de Justiça norte-americano.

Kasimov teria usado dinheiro dele próprio e também verba coletadas com terceiros para financiar a viagem de Akhror Saidakhmetov, que em 2015 planejava lutar pelo Estado Islâmico (EI) na Síria. As acusações contra ele eram a de “conspirar e tentar fornecer apoio material a uma organização terrorista estrangeira designada“.

O réu teria ido pessoalmente ao Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em Nova York, para encontrar Saidakhmetov, com o objetivo de entregar a ele US$ 1,6 mil em dinheiro.

“Kasimov é um apoiador do EI que coletou e deu dinheiro a outro indivíduo para financiar sua viagem para se juntar ao grupo terrorista. Com esta sentença, Kasimov está sendo responsabilizado por seus crimes”, disse o procurador-geral assistente de Segurança Nacional, Matthew G. Olsen.

“A sentença demonstra as consequências significativas para aqueles que ajudam grupos terroristas, inclusive facilitando a viagem de outros para se juntar ao EI”, disse Breon Peace, procurador dos EUA para o Distrito Leste de Nova York. “Kasimov fazia parte de um grupo de indivíduos que buscavam viajar para a Síria para se juntar ao EI ou financiar outros que buscavam se tornar combatentes estrangeiros do EI”.

Membros do grupo jihadista Estado islâmico no Grande Saara (Foto: Divulgação)

Outros três indivíduos foram igualmente sentenciados, entre eles o próprio Saidakhmetov, que pegou os mesmos 15 anos de prisão. A pena foi a mesma imposta a Abdurasul Juraboev, mais um que planejava lutar na Síria. Azizjon Rakhmatov, listado como cúmplice, foi sentenciado a 12,5 anos de prisão. Outras três sentenças ligadas ao caso serão anunciadas nos próximos dias.

“Fornecer apoio financeiro a potenciais combatentes estrangeiros inspirados no EI tem uma penalidade severa”, disse Michael J. Driscoll, diretor assistente do FBI (Serviço Federal de Investigação, da sigla em inglês) em Nova York. “Como Kasimov aprendeu hoje, suas ações vão lhe custar 15 anos atrás das grades. O FBI continua a fazer todos os esforços para proteger os americanos em casa e no exterior e levar outros criminosos de mentalidade semelhante à justiça”.

Por que isso importa?

Nos últimos anos, o EI se enfraqueceu financeira e militarmente. Em 2017, o exército iraquiano anunciou ter derrotado a organização no país, com a retomada de todos os territórios que ela dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do Iraque, hoje mantém apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos, quase sempre focados em agentes do governo. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela organização extremista na Síria.

Em fevereiro deste ano, o grupo sofreu mais um duro golpe quando o exército norte-americano anunciou ter matado Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurashi, principal líder da facção. Durante uma operação antiterrorismo dos EUA na Síria, ele explodiu uma bomba que carregava junto ao corpo, matando também mulheres e crianças que o acompanhavam. O evento foi semelhante a outro, em 2019, que terminou com a morte do líder anterior da organização extremista, Abu Bakr al-Baghdadi.

De acordo com um relatório do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) publicado em fevereiro de 2022, as perdas territoriais e de pessoal transformaram o EI, que antes controlava boas partes da Síria e do Iraque, em “uma insurgência principalmente rural, resistindo à pressão antiterrorista sustentada pelas forças da região”.

A pandemia também continua a ser um desafio, pois impede as “viagens transfronteiriças, diminuindo as ameaças decorrentes de fluxos de combatentes em zonas de conflito e viagens terroristas mais amplas em zonas de não conflito”. Por outro lado, a estagnação do terrorismo em meio à onda de Covid-19 aumenta as “oportunidades de recrutamento e radicalização online”, criando a perspectiva de uma retomada futura das ações extremistas globais.

Outro risco que o grupo oferece é a presença de milhares de ex-combatentes em prisões e campos de deslocados em várias partes do mundo. Devolvê-los a seus países de origem e processá-los judicialmente é um desafio para os Estados-Membros da ONU, e os estabelecimentos que abrigam os extremistas são um potencial alvo de ataques para o EI. Exatamente como ocorreu na prisão de Ghwayran, na cidade de al-Hasakah, na Síria, invadida pelo grupo com a meta de libertar seguidores.

“Devido à capacidade severamente degradada, a sobrevivência futura do EI depende de sua capacidade de reabastecer as fileiras por meio de tentativas mal concebidas, como o ataque a Hasakah”, afirmou o major-general norte-americano John W. Brennan Jr., comandante da força de coalização liderada pelos EUA para combater o EI. Segundo ele, a ação na prisão síria gerou enorme prejuízo ao grupo terrorista, que “sentenciou à morte muitos dos seus que participaram deste ataque”.

Atualmente, o principal reduto do EI é o continente africano, onde consegue se manter relevante graças ao recrutamento online e à ação de grupos afiliados regionais. A expansão do grupo em muitas regiões da África desde o início de 2021 é alarmante e pode marcar sua retomada de força. No Sudeste Asiático, ao contrário, os países da região têm obtido sucesso significativo em interromper o terrorismo de facções afiliadas.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

Tags: