Após criar sindicato na prisão, Navalny diz que foi transferido para a solitária

Navalny sugere que a decisão teria sido uma punição devido à tentativa de criar um sindicato para os trabalhadores do sistema prisional

Alexei Navalny, principal opositor do presidente Vladimir Putin na Rússia, afirmou nesta segunda-feira (15), em sua conta no Twitter, que foi transferido para o confinamento solitário na colônia penal IK-6, onde cumpre uma pena de 11 anos de reclusão.

Como de hábito, Navalny usou o bom humor para anunciar a novidade através da rede social, que é atualizada pela equipe do oposicionista.

“Sou um ícone do consumo consciente. Há apenas uma caneca e um livro na minha cela. Só recebo uma colher e um prato na hora das refeições. Eles até tiraram minhas roupas da prisão e me deram roupas temporárias. Agora eu tenho enormes letras brancas SHU nas minhas costas. Saudações do confinamento solitário”, disse ele.

Navalny sugeriu que a decisão de posicioná-lo na solitária teria sido uma punição pela tentativa de criar um sindicato para os trabalhadores do sistema prisional. “A verdadeira luta sindical nunca é fácil, muito menos na prisão”, afirmou. “O Kremlin quer ver seu Gulag composto de escravos calados. Mas aqui estou eu, reunindo as pessoas e exigindo que algumas leis sejam obedecidas, em vez de implorar por perdão”.

Na semana passada, além de criar o sindicato, Navalny abriu uma ação judicial contra a penitenciária, solicitando informações de quem compra os produtos que ele e outros detentos produzem dentro das instalações. Ele trabalha como costureiro na prisão e diz que recebe por seu trabalho, mensalmente, um salário de 5.173 rublos (R$ 435,55), com carga horária diária de sete horas e 15 minutos de intervalo.

A justificativa oficial para colocá-lo na solitária, segundo ele, teria sido outra: imagens de vídeo mostram Navalny habitualmente trabalhando com um botão do uniforme aberto. “Isso, é claro, me caracteriza como um vilão impenitente e incorrigível. É por isso que foi tomada a decisão de me colocar na unidade de alojamento especial”, afirmou ele, alegando que a roupa é curta, daí o botão aberto.

Embora a promessa inicial seja de mantê-lo na solitária por apenas três dias, o rival de Putin diz que a decisão pode ser tornar permanente caso ele “não reconsidere a atitude”, segundo lhe foi dito pela comissão penitenciária encarregada do caso. “Não está claro que atitude eu deveria reconsiderar. Em relação ao trabalho escravo? Ou em relação a Putin?”, declarou.

Alexei Navalny, que faz oposição doméstica ao presidente Vladimir Putin (Foto: reprodução/Instagram)
Tortura e morte

A colônia penal que abriga Navalny, para onde foi transferido em junho deste ano, tem longo histórico de abusos contra prisioneiros, com relatos de estupro e até morte.

A IK-6 fica em Melekhovo, perto de Vladimir, cerca de 250 quilômetros a leste de Moscou. Ex-agentes carcerários e também presidiários que por lá passaram relatam que eram coagidos pelas autoridades a intimidar os recém-chegados, de acordo com a rede CBS News.

Um caso extremo se destaca, revelado pelo jornal independente russo Novaya Gazeta, em 2018. Gor Ovakimyan, cuja morte dentro da instituição foi oficialmente atribuída a uma pneumonia, na verdade teria morrido em função de lesões causadas por agressões de agentes estatais em uma sessão de tortura.

“Gor nos disse que eles colocaram um balde vazio em sua cabeça, colocaram um alto-falante de baixo e ligaram a música ou algum som de sirene com um efeito ensurdecedor. E jogaram gás sob esse balde para dificultar a respiração”, disse o pai de Ovakimyan ao periódico russo.

“Ele também foi pendurado em uma treliça. Suas mãos foram puxadas para trás da cintura e penduradas como em um rack. E ele ficava pendurado assim, por dez a 12 horas ele ficava pendurado assim”, disse o pai ao jornal. “E por que todos eles fizeram isso? Porque ele se recusou a cooperar com a administração ou incriminar alguém”.

Por que isso importa?

Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A principal plataforma do oposicionista é o combate à corrupção no governo de Vladimir Putin, em virtude da qual ele cobra uma profunda reforma na estrutura política do país.

Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Ele voltou a Moscou em 17 de janeiro de 2021 e foi detido no aeroporto. Um mês depois, foi julgado e condenado a dois anos e meio de prisão por violar uma sentença suspensa de 2014, sob acusação de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.

Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, ele chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril de 2021, para protestar contra a falta de atendimento médico. Depois, em junho, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais de Navalny e a FBK de funcionarem, classificando-os como “extremistas”.

Em janeiro deste ano, ele foi incluído na lista de “terroristas e extremistas” do Serviço Federal de Monitoramento Financeiro da Rússia. No dia 22 de março, foi julgado por peculato e desacato. Condenado, teve o tempo de detenção ampliado em nove anos. Recentemente, mais uma acusação foi adicionada à lista de crimes atribuídos a ele, podendo render-lhe 15 anos adicionais no cárcere.

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