Coreia do Norte oferece cem mil soldados para aumentar contingente de Putin contra a Ucrânia

País liderado pelo autoritário Kim Jong-un é um do seleto grupo de quatro nações que apoia a invasão russa

A Coreia do Norte colocou à disposição de Moscou cem mil soldados “voluntários” para engrossar suas fileiras na luta contra a Ucrânia, segundo a mídia estatal russa. O país liderado por Kim Jong-un é um dos quatro que apoia Vladimir Putin em sua chamada “operação militar especial”, ao lado de Belarus, Síria e Eritreia. As informações são do portal Business Insider.

“Há relatos de que cem mil voluntários norte-coreanos estão preparados para participar do conflito”, disse o especialista militar russo Igor Korotchenko à TV estatal Channel One Russia, destacando a “rica experiência dos militares norte-coreanos com a guerra de contrabaterias”, informou o jornal.

A guerra de contrabateria seria vital para os russos como resistência ao uso de armamento ocidental enviado por parceiros da Ucrânia, em especial o lança-foguetes Himars. O sistema de longo alcance e alta precisão, de fabricação americana, tem feito enorme diferença nos esforços de guerra de Kiev, como ocorreu na retirada de soldados russos da Ilha das Cobras e na estratégica cidade de Kherson.

Vladimir Putin e Kim Jong-un durante encontro em 2019 (Foto: Kremlin.ru)

O anúncio surge em um momento em que o exército russo está exaurido após não ter êxito em controlar territórios importantes da Ucrânia, em especial a capital Kiev. O número de baixas é expressivo: seriam entre 15 e 25 mil soldados russos mortos desde o dia 24 de fevereiro, de acordo com estimativas divulgadas pela revista National Review. Uma média de 100 mortes por dia. Os EUA chegaram a falar falam em 75 mil russos mortos ou feridos, quase metade do efetivo inicial do país na invasão.

A parceria vai além do reforço no front. Korotchenko também disse que o Kremlin quer contar com o trabalho de “construtores” norte-coreanos na reconstrução da região de Donbass, ocupada pelos russos. Lá, a turbulência não é de agora. Cerca de 1,5 milhão de ucranianos foram forçados a deixar suas casas desde que os combates no extremo leste do país entre as forças do governo e os separatistas pró-Rússia começaram em 2014.

“Os construtores coreanos, que são trabalhadores altamente qualificados e prontos para trabalhar nas condições mais difíceis, serão uma parte muito importante na construção da infraestrutura destruída em Donbass”, disse em entrevista ao jornal russo Izvestia o embaixador russo na Coreia do Norte, Alexander Matsegora. Mais de mil trabalhadores iriam para Donbass no caso de uma vitória russa na guerra.

Kim Jong-un possui a quarta maior força militar do mundo, contando com quase 1,3 milhão de militares ativos, de acordo com a ONG Conselho de Relações Exteriores (CFR, da sigla em inglês), de Nova York. Além deles, 600 mil servem como reservistas. No entanto, especialistas em defesa dizem que o exército norte-coreano é defasado, dispondo de equipamentos e tecnologia antigos.

Por que isso importa?

Devido ao alto número de baixas e à falta de mobilização popular, a Rússia tem recorrido a alternativas emergenciais para ampliar seu efetivo na Ucrânia. Há relatos de soldados enviados ao campo de batalha após poucos dias de treinamento, cidadãos recrutados contra a própria vontade e casos de criminosos condenados a quem foi ofertada a liberdade em troca do serviço militar.

Ivan, um soldado de 31 anos que pediu para ter o nome omitido por questões de segurança, relatou o despreparo de colegas combatentes. “Eles nos treinaram por cinco dias, esperamos mais cinco dias por uma rotação de força e depois fomos para as posições [de combate]”, disse ele ao jornal independente The Moscow Times, afirmando que foi voluntário por se considerar “patriota”.

Embora se diga favorável à “operação militar especial”, eufemismo imposto pelo governo para se referir à guerra, Ivan admite desconforto com a inexperiência. E diz que o caso dele nem era o mais preocupante.

Soldados do exército russo em treinamento: efetivo reduzido gera ações emergenciais (Foto: eng.mil.ru)

“Havia um soldado em nossa companhia que não sabia como funciona uma metralhadora. Então, ensinei aquele cara a desmontar e montar uma metralhadora. Eu não gostaria de estar ao lado dele na batalha. Como você pode lutar assim?”, questionou. 

Já o recrutamento em massa de presidiários foi revelado pela ONG de direitos humanos Gulagu.net. A convocação dos detentos para lutar na guerra teria sido feita pela FSB (Agência de Segurança Federal, da sigla em inglês) e pela organização paramilitar Wagner Group. Os centros de recrutamento seriam colônias penais das regiões de São Petesburgo, Tver, Ryazan, Smolensk, Rostov, Voronezh e Lipetsk.

Também surgiram denúncias de que as forças armadas têm usado conscritos, que são jovens enviados ao combate mesmo contra a própria vontade. O governo sempre negou a informação, alegando usar apenas soldados profissionais, todos voluntários com contrato assinado.

No entanto, em março, o Ministério da Defesa admitiu que alguns conscritos foram enviados por engano, mas já teriam retornado à Rússia. Mais tarde, no início de junho, a Justiça militar abriu procedimentos disciplinares contra ao menos 12 oficiais de suas forças armadas acusados de enviar conscritos à guerra.

A questão é sensível no país, e Moscou teme insatisfação popular generalizada com as eventuais mortes de jovens na guerra. Há inclusive registros de entidades que representam mães russas alegando que os filhos foram combater sem treinamento adequado.

Legalmente, a questão gera debate. A legislação russa permite o envio de conscritos à guerra, desde que cumpram o período de quatro meses de serviço militar. O serviço militar no país é obrigatório para homens entre 18 e 27 anos.

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