Número de chineses em busca de asilo político no exterior explodiu com Xi Jinping no poder

Crise econômica e repressão estatal ajudam a explicar um êxodo que aumenta desde 2013, tendo os EUA como destino preferencial

Desde 2013, ano em que Xi Jinping assumiu o governo da China, até o final do ano passado, o número de cidadãos chineses em busca de asilo político no exterior vem aumentando gradualmente. Segundo dados da ONU (Organização das Nações Unidas), tal estatística saltou de pouco menos de 25 mil pessoas no primeiro ano analisado para mais de 120 mil em 2023. Esse fenômeno pode ser explicado por questões como a crise econômica enfrentada por Beijing, a repressão religiosa e as restrições à liberdade de expressão impostas pelo Partido Comunista Chinês (PCC), segundo reportagem da rede CNN.

Curiosamente, os EUA se tornaram, desde 2013, o principal destino dos chineses em busca de asilo político. Em 2012, um ano antes da ascensão de Xi, Washington recebeu 5,4 mil desses pedidos provenientes da China, enquanto todas as outras nações do mundo juntas receberam dez mil solicitações chinesas. Esse número se equilibrou a partir de 2013, e desde então a discrepância não para de aumentar.

Em 2023, o território norte-americano foi o destino de 95,2 mil cidadãos chineses em busca de asilo político, de acordo com o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). Somados, todos os demais países do mundo receberam quase um quarto desse número: 25,7 mil pedidos.

Bairro de Chinatown, em Nova York, tradicional reduto da comunidade chinesa (Foto: NYCDOT/Flickr)

Mesmo no caso de migrantes em busca de residência permanente os números chamam a atenção. De acordo com o anuário de Imigração do governo norte-americano, mais de 662 mil chineses obtiveram o direito de viver legalmente nos EUA entre 2013 e 2022. Trata-se do terceiro país que mais entregou imigrantes à principal economia do mundo no período, atrás somente de México e Índia.

No caso dos migrantes, muitos dos chineses que tentam ingressar nos EUA o fazem de forma ilegal, por rotas perigosas por países vizinhos. Nos primeiros 11 meses do ano passado, as autoridades de fronteira norte-americanas detiveram mais de 31 mil chineses tentando atravessar para o país a partir do México, em comparação com uma média de 1,5 mil casos anuais na década anterior.

Justificativas para deixar a China

Entre os migrantes ou requerentes de asilo, uma das alegações para deixar a segunda maior economia do mundo é a falta de emprego. O problema aumentou consideravelmente com a pandemia de Covid-19, que levou o governo a impor bloqueios radicais em todo o país, trancando a população dentro de casa sob a justificativa de conter a doença.

Ante à delicada situação econômica, o governo inclusive censurou o tema. Em dezembro, o Weibo, plataforma de rede social chinesa semelhante ao (antigo Twitter), emitiu alertas automáticos aos usuários solicitando que evitassem críticas à economia, conforme o ritmo de crescimento do país diminui.

Os números, porém, não deixam margem a dúvida. O Banco Mundial prevê uma desaceleração adicional no crescimento do PIB da China para 4,5% em 2024 e 4,3% em 2025, o que levou a instituição a expressar preocupação. Citou como questões que merecem atenção a redução do consumo interno e a confiança dos investidores, descrevendo a economia chinesa como “frágil”.

Os ataques à liberdade de expressão, como no caso da censura às críticas econômicas, igualmente explicam o desejo de muitos chineses irem embora. A censura marca presença sobretudo na internet, com veículos jornalísticos silenciados, restrições impostas a qualquer debate referente à pandemia, grandes filmes impedidos de ir aos cinemas e até manifestações de pesar proibidas.

“Três anos de confinamentos e restrições devido à Covid-19 deixaram pessoas desempregadas em toda a China – e desiludidas com o controle cada vez mais rígido do Partido Comunista no poder sobre todos os aspectos da vida sob Xi”, diz a reportagem da CNN.

Há, ainda, a questão religiosa. Desde que chegou ao poder, Xi Jinping impôs um processo gradual de “sinicização” da fé, que levou Beijing a intensificar o controle para adequar mesmo as questões religiosas aos princípios do PCC.

O principal expoente do desafio que os fieis enfrentam na China é a etnia muçulmana dos uigures, que habitam a região autônoma de Xinjiang. Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” na província, onde foram identificados “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero.”

Os católicos não estão livres das garras do Estado, e o Vaticano acusou Beijing em 2022 de desrespeitar um acordo firmado quatro anos antes, segundo o qual todas as nomeações de líderes católicos na China seriam feitas em comum acordo. Ignorando o que ficou acertado, o governo chinês tem optado por fazer ele próprio as nomeações, escolhendo assim indivíduos tendentes a acatar as ordens do PCC.

Entre os migrantes entrevistados pela CNN, um chinês de meia idade que conseguiu entrar ilegalmente nos EUA usou a justificativa religiosa ao explicar a decisão de fugir da China. “Somos cristãos”, disse ele, referindo-se a um grupo que vivia em um acampamento improvisado já no território norte-americano, perto da fronteira com o México.

Mas são mesmo os muçulmanos que representam a maior parcela de cidadãos chineses dispostos a mudar de país por questões étnico-religiosas. De acordo com Ma Ju, líder da comunidade sino-muçulmana nos EUA, seus compatriotas sofrem na terra natal conforme observam os “meios de subsistência e vários interesses serem violados.”

Assim, buscar uma vida melhor no exterior é uma opção para muitos deles. “Independentemente de estarem aqui por razões económicas ou outras coisas, é por dignidade, algo que nunca tiveram no seu país de origem”, disse Ma.

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