Rússia determina o fim das atividades de sua mais antiga organização humanitária

Grupo Helsinki se ergueu contra a lei do agente estrangeiro, ajudou belarussos a evitar a extradição e vinha apoiando civis ucranianos

A Justiça da Rússia determinou na quarta-feira (25) o encerramento das atividades do Grupo Helsinki de Moscou (MHG, na sigla em inglês), a mais antiga organização de direitos humanos do país e uma das últimas em atividade por lá. As informações são do site independente Mediazona.

A decisão atendeu a um pedido do Ministério Público russo, sob a alegação de que o registro legal da entidade permitia que ela atuasse somente em Moscou, mas irregularmente se fez presente também no restante do país.

Valery Borshov, co-presidente do grupo, fez um discurso emocionado ao juiz, que levou apenas 25 minutos para sentenciar. “A facilidade com que você decide nosso destino me surpreende. Como pode ser tão fácil destruir o que foi construído por décadas? Foi difícil de construir, exigiu grandes esforços, sacrifícios, vidas humanas”, disse ele.

Prédio da Corte Constitucional da Rússia: ONGs na mira do Judiciário local (Foto: WikiCommons)

O MHG teve atuação marcante em momentos importantes da história recente. Na Rússia, foi uma das primeiras organizações a se erguer contra a “lei do agente estrangeiro“, hoje usada pelo governo para silenciar a oposição e censurar a imprensa independente.

A organização também ajudou muitos cidadãos belarussos a evitar a extradição depois de terem chegado à Rússia fugindo do regime ditatorial de Alexander Lukashenko. Hoje, vem atuando para dar suporte a ucranianos vítima de perseguição devido à guerra desencadeada pela invasão russa.

“Você está cometendo um grande pecado. Você está destruindo o movimento de direitos humanos, você o está destruindo”, disse Borshov durante a audiência, segundo a rede Radio Free Europe (RFE). “Dissolver o grupo é um duro golpe para o movimento de direitos humanos não apenas na Rússia, mas também no mundo”.

Por que isso importa?

Organizações não governamentais, veículos de imprensa e os colaboradores de ambos têm sido alvo de uma dura repressão do governo de Vladimir Putin, com o respaldo da Justiça do país. A perseguição se escora na “lei do agente estrangeiro”, que foi aprovada em 2012 e modificada diversas vezes, dando às autoridades o poder de acessar todas as informações privadas das instituições e indivíduos rotulados.

A designação “agente estrangeiro” carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. A classificação acaba por afastar potenciais parceiros comerciais e anunciantes, muitas vezes sufocando financeiramente as instituições listadas.

Órgãos e indivíduos nessa condição e que não atendam às exigências impostas pela lei podem pegar pena de até dois anos de prisão, de acordo com o código penal russo, e as organizações correm o risco de serem proibidas de funcionar. Tal sistema repressivo tem sido a principal arma do Kremlin para calar os críticos, levando a ordens de prisão, casos de exílio forçado e ao fechamento de entidades.

Uma das vítimas desse sistema repressivo foi a ONG Memorial Internacional, organização ligada aos direitos civis que estava em funcionamento desde os tempos da antiga União Soviética. A entidade teve seu funcionamento proibido pela Justiça russa em dezembro de 2021.

Criada no final dos anos 1980, a Memorial documentou a repressão política na antiga União Soviética e construiu um banco de dados das vítimas da violência estatal. Listada como “agente estrangeiro” em 2014, a ONG foi acusada de violações às regras impostas a entidades assim rotuladas, por não marcar todas as suas publicações e atividades com o selo de “agente estrangeiro”.

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